Quarta-feira, 12 de março de 2025
Por Redação O Sul | 2 de outubro de 2020
Dois anos após a chegada de Iván Duque à Presidência da Colômbia, e quatro anos após a assinatura do acordo de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), as chacinas no país atingiram o maior número desde 2013, com 260 mortos em 65 episódios. Os dados, publicados pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento e a Paz (Indepaz), revelam o aumento da violência principalmente nos territórios antes ocupados pela guerrilha, onde não foram implantados os programas previstos no pacto de 2016. Só em agosto foram 11 massacres; em setembro, 16.
Para analistas ouvidos pelo jornal O Globo, a incapacidade do Estado de ocupar essas áreas, onde estão sendo descumpridos vários pontos do acordo de paz, explica o aumento das chacinas. Além disso, o governo minimiza os casos aos chamá-los de “assassinatos ou homicídios coletivos”, afirma a jornalista e cientista política colombiana Olga Behar. Critérios internacionais definem chacina como homicídios intencionais e simultâneos de três ou mais pessoas, em situação indefesa, em circunstâncias iguais de tempo, forma e lugar.
“O governo de Iván Duque não tentou entender o fenômeno dos massacres e nem parece compreender a gravidade da situação, oferecendo uma resposta militar a fenômenos de violência”, afirma Behar. “Sem explicar a relação política e econômica entre os massacres e ao mudar sua nomenclatura, ele minimiza o problema e tenta reduzir as estatísticas.”
As regiões mais atingidas, segundo o Indepaz, são os departamentos de Antioquia (14 massacres este ano), Cauca (9) e Nariño (9), zonas antes ocupadas pela guerrilha. A mais recente onda de violência, há duas semanas, deixou ao menos dez mortos em dois massacres em Cauca e Nariño. Em agosto, em 11 dias, 33 pessoas foram mortas na mesma região. Em quase todos os casos, autoridades apontaram dissidentes das Farc como responsáveis pelos ataques.
Na semana passada, o ministro da Defesa, Carlos Holmes Trujillo, rebateu às críticas e afirmou que “a força pública, em particular o Esquadrão Antimotins, não incorre institucionalmente em excessos” e que, se eles aconteceram, se devem a “ações individuais”. A prefeita de Bogotá, Claudia López, enfrentou publicamente o ministro questionando, no Twitter, se ele “reconhece que fracassou como ministro da Defesa”.
Duque ganhou as eleições graças à bandeira de segurança defendida pelo seu partido, o Centro Democrático, fundado pelo ex-presidente Álvaro Uribe, hoje em prisão domiciliar. Como Uribe, Duque se opôs ao acordo de paz, e acaba minando-o ao não cumprir vários de seus pontos, especialmente os relacionados à substituição do cultivo de coca e aos planos de desenvolvimento territorial, o que acabou gerando mais violência e instabilidade.
“Os conflitos territoriais aumentaram sobretudo nas zonas onde o Estado não chegou. Refiro-me a um Estado integral, não somente à força pública”, diz Leonardo González, coordenador do Observatório de Direitos Humanos do Indepaz. “A única forma de ocupar o espaço deixado pelas Farc é com a chegada de saúde, educação, crédito aos camponeses. Paradoxalmente, onde há mais força policial houve mais massacres. Esse não é o remédio para a ausência do Estado.”
Behar lembra ainda que “a força da guerrilha não vinha apenas das armas, mas justamente por conseguir fazer o papel que o Estado não cumpria nesses locais”. “A situação claramente saiu das mãos do governo, mas não há vontade política de fazer uma reflexão sobre esses erros. Duque se elegeu prometendo destruir o acordo de paz, e desde então o processo praticamente foi estancado. Sua prioridade deveria ser governar para todos, e não para seu partido”, afirma ela. As informações são do jornal O Globo.