O jovem Ali Babá, que viajava pela Pérsia para levar notícias ao rei, estava no alto de uma árvore quando ouviu estranhas palavras ditas por um dos 40 ladrões que vira passar enquanto descansava: “Abre-te, Sésamo!”. Era um comando mágico, que abria uma caverna onde estavam escondidos tesouros daqueles que quem ouvia as histórias contadas por Sherazade ao sultão durante mil e uma noites já estava até acostumado a imaginar.
E, seguindo o padrão narrativo, também não era difícil adivinhar o que viria: Ali Babá esperou a saída dos bandidos para repetir as palavras mágicas, entrar e carregar o máximo possível de riquezas — que ofereceu como dote para pedir a princesa em casamento.
Em busca de um final feliz na Copa do Mundo, havia duas defesas quase tão difíceis de transpor quanto a caverna do tesouro: a Croácia chegou às semifinais tendo sofrido apenas três gols, um deles na prorrogação; Marrocos, só um, e contra. Diferentemente de seus adversários, as tradicionalíssimas Argentina e França, essas duas seleções, que estrearam no Catar se enfrentando (e empatando, claro, em 0 a 0) ainda estavam invictas. Até que ouviram as palavras mágicas: Messi! Mbappé! E conheceram a derrota. Agora, vão se despedir com um reencontro, na disputa pelo terceiro lugar.
A pedra que se moveu ao ouvir o comando de Ali Babá respondeu da mesma maneira quando ele voltou, para levar mais algumas preciosidades e comprar um castelo para morar com a futura esposa. Já os perdedores das semifinais abriram o caminho de suas defesas de formas bem diferentes. E, claro, o modo de ver os dois jogos das semifinais não poderia ter sido igual sob um olhar brasileiro.
Na terça-feira, a gente ainda se perguntava por que a Croácia não falhou assim nas quartas de final quando Messi fez seu terceiro gol em jogos eliminatórios de Copa (todos nesta edição). Mas, claro, reparamos que a comemoração foi sem dancinha. Os argentinos não comeram bife de ouro, não jogaram o gato no chão, não deram saída de letra, não… Não deu nem tempo de acabar a lista das comparações aleatórias e já estava 2 a 0.
Quando o Brasil não consegue atravessar o deserto, a Argentina se torna a terra que emana leite e mel. Lá a torcida canta o tempo todo, jogador leva a Libertadores para o Catar e a AFA… Não, elogiar cartola não precisa, né? Vamos ficar com outra certeza de ocasião: se o time deles vira o primeiro tempo ganhando, não cede o empate no segundo.
Na quarta-feira, o primeiro gol da França sobre o Marrocos também não demorou a sair. Mas o outro, que finalmente deu tranquilidade aos atuais campeões do mundo, só veio no segundo tempo, depois de uma pressão que teve, entre outras finalizações perigosas dos marroquinos, uma bicicleta que parou no pé da trave. A história mais bonita da Copa não durou mil e uma noites, e terminou com as lágrimas de uma torcida que encantou o mundo com o amor que demonstrou no Catar.
Marrocos e Croácia vão se despedir no penúltimo capítulo. O último ficou para Messi e Mbappé decidirem quem fica com o tesouro da Copa – que só tem uma peça dourada, mas é mais cobiçada do que a mão da princesa da Pérsia.