Médicos que compõem a Câmara Técnica Assessora de Imunização Covid-19, instância de aconselhamento do Ministério da Saúde, cogitam deixar a comissão se a pasta não voltar atrás na decisão de interromper a vacinação de adolescentes.
Em reunião virtual bastante tensa na tarde desta sexta-feira (17), especialistas e membros de sociedades e conselhos de medicina que compõem o colegiado, além de representantes de secretarias estaduais e municipais do setor rechaçaram de forma unânime a decisão do ministro Marcelo Queiroga de parar a vacinação para a faixa de 12 a 17 anos.
Conforme relatos de participantes da reunião, eles exigiram que o Ministério elabore uma nova nota técnica esclarecendo que a equipe de especialistas não foi consultada e que discorda da decisão. Exigiram também que a pasta defina um calendário para a retomada da vacinação deste grupo etário.
Um dos médicos presentes defendeu que a nota saísse já neste fim de semana. O objetivo é arrefecer os temores e o pânico provocados em pais de adolescentes, além da contrariedade por parte de movimentos antivacina.
Morte de adolescente
Ao anunciar a interrupção da vacinação para esse grupo, o ministro Marcelo Queiroga argumentou que havia um caso de uma adolescente que havia morrido após receber uma dose da Pfizer. Ele mesmo admitiu que não sabia se o fato tinha relação com o imunizante, mas enfatizou riscos de miocardite em vacinados.
Nesta sexta-feira, porém, a Secretaria da Saúde de São Paulo descartou que a morte da jovem tenha tido a ver com a vacina. Segundo o laudo da secretaria, a morte da adolescente está relacionada a uma doença autoimune que ela tinha, a púrpura. “Tal caso não pode ser usado como sinal de segurança, muito menos ser justificativa para alterar a estratégia de vacinação”, diz a nota da secretaria paulista.
O ministro Queiroga não participou da reunião de hoje. Quem ouviu as queixas dos médicos e dos representantes de conselhos de secretários de saúde foi a secretária extraordinária de enfrentamento à Covid-19, Rosana Mello, que assinou a nota que suspendeu a vacinação e provocou a atual crise. Ela ficou de levar os argumentos a Queiroga e responder até a próxima sexta-feira.
Se o Ministério não atender às exigências dos médicos, eles dizem que deixarão a Câmara Técnica. “Não faz sentido a gente ficar lá para não ser ouvido. A gente não ganha nada por isso e ainda fica tomando bordoada por coisas absurdas”, desabafou um dos integrantes, que pediu para se manter em anonimato.
Além da disseminação da suspeita infundada sobre a vacina, também irritou os médicos o fato de a nota do Ministério que acompanhou o anúncio da interrupção da primeira dose para os adolescentes recorrer a justificativas falsas, como a de que a Organização Mundial de Saúde (OMS) desaconselha o procedimento nessa faixa etária.
“Você acha que os Estados Unidos estariam vacinando sua população se houvesse tal risco?”, questionou outro médico que integra o colegiado. “A Inglaterra recomendou apenas uma dose de Pfizer até concluir estudos sobre o risco de miocardite, mas isso deve cair nas próximas semanas. A primeira dose segue sendo obrigatória”.