A semana passada foi calma e silenciosa, comparada com outras da era Bolsonaro. Ninguém disse bobagens maiores, – a não ser as de praxe, que nada é perfeito –, ninguém atravessou a rua para enxovalhar o transeunte distraído, e as ofensas comuns entre políticos se mantiveram em limites aceitáveis.
O fato de que Bolsonaro esteve acamado não foi coincidência. A boca fechada por recomendação médica, os cuidados pós-cirúrgicos causaram uma redução saudável da temperatura política: o principal atirador, o ‘‘ripper’’ mais açodado, teve de ceder aos cuidados da convalescença.
Mas ninguém se entusiasme muito, o mito está para voltar. E ninguém esqueça que – provavelmente – virá com o ânimo redobrado. Não nos acostumemos à calmaria, porque ela é enganosa.
No ínterim, a vida seguiu seu curso. Não tenho certeza, mas de certo modo até melhor, sem a oposição que o presidente faz a si mesmo e ao seu governo.
Os admiradores e áulicos de Bolsonaro falam bem dele quer ele faça alguma coisa de bom ou não faça nada, como agora. Vejam o excelente jornalista J. R. Guzzo, de Veja, que por um desses mistérios que ninguém é capaz de explicar, torceu, e provavelmente votou, em Bolsonaro.
Guzzo é inteligente, elegante, perspicaz – tudo ao inverso de Bolsonaro – e deve se sentir constrangido com o descontrole verbal do presidente e com o seu apreço por gestos e declarações de insensatez. Para não dar o braço a torcer, ele contorna, evitando falar de Bolsonaro, mas enaltecendo ações e conquistas supostas do novo – embora tenha envelhecido precocemente – governo.
Pois ele mesmo, Guzzo, em artigo de Veja, sustenta que “há oito meses não se rouba por atacado no governo federal”. Talvez seja verdade, mas não porque Bolsonaro é presidente. É por causa de uma pouco lembrada decisão do Supremo Tribunal Federal, que em 2015 proibiu as empresas de doarem recursos para as campanhas eleitorais.
Retirou-se dos políticos e dos operadores de caixa dos partidos, o pretexto para extorquir empreiteiras, fornecedores e prestadores de serviços do setor público, de obter recursos para o partido e as campanhas eleitorais – a origem da corrupção “por atacado”. A Lava-Jato continua investigando atos de corrupção anteriores a 2015. Todos os seus casos são, por assim dizer, velhos.
Medalhões do jornalismo brasileiro não sabem disso. À época da decisão do STF foram incapazes de prever as consequências que dali iriam decorrer. Preferem ver em Bolsonaro alguma relevância na redução, senão do fim, da corrupção no Brasil.
Preferem virar a borduna para o STF e seus ministros. E no entanto, a mais vigorosa medida de combate à corrupção, o ataque na fonte da bandalheira, foi feita sem alarde, não pela Lava-Jato, não por Moro ou Dallagnol, mas pelo STF.
No mesmo artigo, J. R. Guzzo informa que os homicídios diminuíram em 20% no primeiro semestre de 2019, dando a entender que o mérito foi do governo. Como não se tem notícia de nenhuma medida para conter a mortandade, a única explicação é que os bandidos, por conta própria, com medinho da dupla Moro-Bolsonaro, resolveram dar um tempo e conter o ímpeto de matar.