O processo conturbado que envolveu a liberação da vacinação infantil contra a covid-19 no Brasil não terminou com o envio das primeiras remessas de doses pediátricas pelo Ministério da Saúde. Secretarias de Saúde de pelo menos cinco estados relataram problemas graves na logística de transporte sob o comando do governo federal na última sexta-feira (14). Em alguns casos, as falhas quase comprometeram lotes inteiros de imunizantes.
Pernambuco, Paraíba, Bahia, Minas Gerais e Tocantins enfrentaram diferentes obstáculos que envolveram desde atrasos até o abandono da carga pela empresa responsável pelo transporte das doses. Os problemas, no caso do primeiro Estado, começaram já na madrugada de sexta-feira.
Desde o início da campanha de imunização contra a covid, em janeiro de 2021, a distribuição de vacinas no Brasil se dá da mesma forma: os imunizantes chegam do exterior, são armazenadas no depósito do Ministério da Saúde no Aeroporto de Viracopos, em Campinas, e despachadas para todas as unidades da federação. Os Estados supervisionam a entrega nos aeroportos das capitais, e uma empresa contratada pelo governo federal transporta a carga até a central estadual, responsável pela distribuição para todos os municípios.
Nos últimos 12 meses, a responsável pelo deslocamento entre os aeroportos e os depósitos dos governos estaduais foi a empresa VTCLOG. Dessa vez, contudo, as secretarias foram surpreendidas com uma nova companhia, a IBL, com sede em Guarulhos. Em alguns estados, secretarias relataram que a empresa simplesmente não apareceu. Outros relataram que a IBL não conferiu a integridade dos lotes e a temperatura das vacinas, o que é de praxe antes da liberação do material.
O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) confirmou que pelo menos quatro estados enfrentaram obstáculos nas entregas de vacinas. Para a superintendente de imunizações de Pernambuco, Ana Catarina Melo, a mudança na prestadora de serviços em uma etapa sensível da vacinação de brasileiros e sem comunicar os estados foi uma decisão equivocada. Os problemas levaram ao atraso do início da imunização de crianças no Estado.
A superintendente relata, em consonância com outros estados, que o Ministério da Saúde enviou o planejamento de voos apenas na véspera do início das entregas. No caso de Pernambuco, as vacinas da Pfizer chegariam às 1h20m da madrugada de sexta. Após a mobilização da secretaria de Saúde no aeroporto, as equipes receberam relatos em grupos de WhatsApp de que a IBL só funcionaria até às 19h. Nem mesmo o ministério soube orientá-los, segundo Ana Catarina.
Por fim, o governo pernambucano foi informado de que as vacinas só chegariam ao Recife às 10h40m. Ao retornarem pela manhã, os funcionários da secretaria tiveram uma nova surpresa: a empresa responsável pelo transporte não estava presente. Segundo a superintendente, a IBL informou que o caminhão já estava no aeroporto, o que não havia acontecido.
Depois, recebeu uma comunicação do Departamento de Logística do Ministério da Saúde informando que a responsabilidade do transporte sempre fora do governo estadual. Por fim, o veículo da empresa só chegou próximo das 14h, quando a temperatura das doses já havia baixado consideravelmente – e com um furgão de pequeno porte, no lugar de um caminhão.
No Estado vizinho da Paraíba, os problemas se repetiram. Dessa vez, não houve problemas quanto à logística do voo, mas a secretaria de Saúde também teve problemas com a IBL. A pasta informou que houve espera de 2h30 entre a chegada do avião em João Pessoa e o transporte dos imunizantes. O órgão informou que não houve prejuízos quanto à estabilidade das doses.
Já na Bahia, a secretaria de Saúde relatou três reprogramações de voos, o que, segundo a pasta, acarretaram em dificuldades logísticas. A chegada estava prevista para 1h20m da manhã de sexta-feira, mas acabou ocorrendo apenas às 14h40m. Também houve oscilação das doses. Em consequência dos desencontros, não houve distribuição aérea das vacinas para os municípios baianos.
No Tocantins, o governo foi surpreendido por uma troca de voo de última hora. Mas, segundo apurou o blog, a empresa sequer chegou a aparecer no aeroporto de Palmas. De acordo com a secretaria de Saúde, foi necessário que um representante do Ministério da Saúde no estado buscasse as vacinas para levá-las à central estadual. Em Minas Gerais, houve mudança de voos em relação ao planejamento do ministério, segundo a secretaria de Saúde, sem intercorrências no deslocamento.
O Ministério da Saúde informou que investiga as falhas relatadas pelos Estados. Em nota, a pasta afirmou que não houve prejuízo a nenhum dos imunizantes pediátricos entregues na primeira remessa e que “prestou toda assistência aos entes federados no processo de envio da doses”.
Indagado sobre a troca da empresa em um momento crítico para a proteção da população infantil, a Saúde alegou que a IBL foi contratada em um processo seletivo no qual concorreram diversas empresas, inclusive a VTCLOG, que ainda cuida dos contratos de vacinas Pfizer aplicadas em adultos. “O contrato com a IBL prevê o transporte a temperaturas ultra frias, na faixa dos 60°C aos 90° C negativos, como exige o imunizante pediátrico para que se mantenha a validade original e que não está previsto no atual contrato com a VTCLOG”, justificou.