Quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 11 de fevereiro de 2025
Há um ano no Ministério da Justiça, Ricardo Lewandowski trocou a premissa da vida dedicada à magistratura, de que decisão judicial se cumpre e ponto final, pelos meandros da política e a necessidade de buscar viabilidade e consenso. Após 17 anos no Supremo Tribunal Federal (STF), o titular da pasta mais antiga da Esplanada mexeu em regras de atuação das polícias para torná-las menos letais e reforçou procedimentos e equipamentos de segurança em presídios federais depois da primeira fuga no sistema. Mas viu a principal pauta da gestão emperrar no próprio Executivo.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública tem resistências de colegas do primeiro escalão e governadores, o que levou o ministro a tentar uma aliança com o governador do Rio, Cláudio Castro, correligionário de Jair Bolsonaro, diante da crise que o estado enfrenta na área. Lewandowski também busca se aproximar de ministros do Centrão, como Silvio Costa Filho (Portos e Aeroportos), para conseguir mais articulação no Congresso.
O ministro precisou ainda adiar para julho de 2025 a transferência da fiscalização dos CACs do Exército à Polícia Federal por falta de recursos e efetivo capacitado da corporação — atraso de uma política considerada prioritária por Lula. E a construção da muralha do presídio federal em Mossoró (RN), uma das primeiras promessas da gestão Lewandowski, só foi iniciada no último mês.
O texto da PEC da Segurança está travado há quase oito meses. Foi e voltou duas vezes da Justiça à Casa Civil, de Rui Costa, e atualmente passa por ajustes na Secretaria de Relações Institucionais, de Alexandre Padilha, ainda sem perspectiva de ser mandado ao Congresso. Lewandowski fez uma nova versão, atendendo a sugestões de governadores. Retirou a previsão de “observância obrigatória” dos estados às diretrizes da União e explicitou que a competência pelas polícias militares, civis e penais continua a ser dos governadores. Casa Civil e Relações Institucionais não se manifestaram.
Lewandowski busca nesse momento o que resume a assessores como “viabilidade política”. O ritmo de andamento da PEC ilustra a principal diferença entre as décadas de magistratura, quando sua atuação individual muitas vezes bastava para que alguma medida saísse do papel. A mudança no modelo de fiscalização dos Colecionadores, Atiradores e Caçadores (CACs) e a construção de muralhas nas penitenciárias também andam em velocidade mais lenta do que a desejada inicialmente.
A PEC prevê incluir na Constituição o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), para possibilitar uma integração maior entre as três esferas de governo. A iniciativa amplia as prerrogativas da Polícia Federal (PF) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF), que teriam mais condições de enfrentar facções criminosas.
O apoio de governadores alinhados a Lula já veio. O foco está na oposição, especialmente em Castro, o primeiro governador a ser recebido pelo ministro neste ano, além de ser um dos que mais pedem ajuda devido à crise de segurança no Rio.
“O magistrado vê o mundo por uma janelinha estreita, que são os autos do processo. E aqui a gente tem uma visão mais ampla sobre a segurança pública”, afirmou Lewandowski.
Na última quarta (5), Castro pediu a transferência de líderes de facções para presídios federais e foi atendido. Na reunião, Lewandowski disse que a PEC serviria para melhorar essa integração. Segundo interlocutores, ouviu do governador que ele iria fazer um evento no Rio para que o ministro promovesse a proposta, o que foi interpretado por auxiliares do chefe da Justiça como um gesto de apoio. Procurado, Castro não se manifestou. Antes, tinha dito que a discussão da PEC era válida, mas não resolvia os problemas de segurança.
Na busca por adesão, Lewandowski driblou até um suposto incômodo de Lula com a participação de ministros em eventos organizados pelo ex-governador João Doria. No fim de janeiro, ele discursou para empresários em um almoço promovido pelo ex-tucano e fez um apelo à “lealdade federativa” dos governadores. A assessores, argumentou que estava cumprindo a ordem do presidente de “conversar com a sociedade”.
No caso do reforço na Penitenciária de Mossoró, a demora no início da obra está ligada a aspectos técnicos, e não políticos, segundo o secretário de Políticas Penais, André Garcia. A meta é que todas as cinco penitenciárias federais contem com muralhas, mas hoje apenas a de Brasília possui a estrutura pronta.
A fuga de dois integrantes do Comando Vermelho da unidade de Mossoró, o primeiro caso de evasão em uma penitenciária federal, foi a primeira crise com a qual Lewandowski se deparou — e deu uma amostra do tamanho dos desafios logo na largada da gestão, em fevereiro de 2024. A interlocutores, o ministro resumiu que o primeiro ano como ministro serviu mais para “tomar pé” dos trabalhos da pasta e “arrumar a casa”.
Nas medidas que só dependiam da sua caneta, Lewandowski elaborou um decreto com novas regras sobre o uso da força pelas polícias, homologou 11 terras indígenas e limitou o escopo de atuação da PRF às rodovias — no governo Bolsonaro, a corporação se envolveu em tiroteios em favelas.