O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que morreu no último sábado (8), deixou um legado de valor inestimável para o Direito Imobiliário brasileiro, tendo acumulado a relatoria de diversas decisões importantes para o setor desde o último ano.
De acordo com levantamento feito pelo advogado especialista no tema Gabriel de Britto Silva, integrante da comissão de arbitragem e condominial da OAB-RJ, os acórdãos relatados pelo ministro em 2022 e neste ano deram “norte, luz e segurança jurídica às relações imobiliárias de todo o gênero”.
Britto Silva descreve Sanseverino como um “ministro de extremada qualidade técnica”, “inovador”, “moderno” e “arrojado”.
Julgados
Algumas decisões se relacionaram com “pontos de intersecção entre o Imobiliário e os demais ramos do Direito”. Um exemplo de área abrangida foi a do Direito de Família.
Em um dos acórdãos, o STJ decidiu, com base na sua própria jurisprudência e na Lei 8.009/1990, que o imóvel oferecido pela entidade familiar (qualquer união afetiva) como garantia real para pagamento de dívida contratual é penhorável.
Já outra decisão assentou, também com base em precedentes do tribunal, que a cobrança de aluguéis em favor de ex-cônjuge, devido à ocupação exclusiva do imóvel comum, não depende de partilha.
Ainda dentro da temática interseccional, uma decisão relatada por Sanseverino reiterou que a copropriedade anterior à abertura da sucessão impede o reconhecimento do direito real de habitação, pois sua titularidade é comum a terceiros estranhos à relação sucessória. No caso concreto, o STJ impediu que a última cônjuge de um homem falecido continuasse morando sem pagar aluguel no imóvel pertencente a ele e suas filhas de outro casamento.
Em intersecção com o Direito Empresarial, Sanseverino foi relator de um processo no qual a corte confirmou que o juízo da recuperação judicial tem competência para analisar a essencialidade de bens para o êxito do processo, mesmo quando a discussão envolver ativos que não se sujeitariam ao concurso de credores. O caso concreto se referia ao imóvel alugado no qual era desempenhada a atividade da empresa.
O ministro também foi acompanhado pelos colegas ao sugerir que o crédito garantido fiduciariamente não se submete à recuperação judicial, pois é de propriedade do credor, e não da empresa recuperanda.
Ainda no campo da alienação fiduciária, o STJ reafirmou sua jurisprudência no sentido de que o devedor fiduciante é responsável pelas despesas condominiais enquanto estiver na posse direta do bem.
Já dentro do tema das relações locatícias, o STJ decidiu que, em ações renovatórias, o magistrado não pode fixar valor superior ao pretendido pelo locador ou inferior ao oferecido pelo locatário, pois isso violaria limites objetivos traçados pelas partes.
Nos temas essencialmente imobiliários, Sanseverino contemplou casos de usucapião. Ele estipulou, por exemplo, que os bens integrantes do acervo patrimonial de sociedades de economia mista não são usucapiáveis quando estão sujeitos a uma destinação pública.
A Corte também decidiu que, após duas tentativas frustradas de intimação pessoal do devedor, admite-se a notificação por edital.
Alienação judicial
Com base em precedentes e no próprio Código de Processo Civil, Sanseverino foi responsável pela relatoria do julgamento em que se estabeleceu a possibilidade de alienação judicial do bem indivisível em sua integralidade, em qualquer hipótese de copropriedade, resguardando os direitos do condômino no produto da alienação.
O ministro também foi buscar na jurisprudência a tese de que, na execução condominial, é possível a penhora do imóvel mesmo que o proprietário não tenha participado da fase de conhecimento.
Em outro processo relatado por Sanseverino, a corte decidiu que o atraso na entrega do imóvel não gera, por si só, dano moral indenizável, pois é preciso comprovar as circunstâncias específicas que possam configurar tal lesão. Ficou estabelecido que o dano só ocorre quando o atraso ultrapassar o limite do mero dissabor.
Ainda assim, em outra ação, o ministro também foi acompanhado pelos demais ao definir que há presunção do prejuízo do comprador e dos lucros cessantes em caso de atraso na entrega.
O magistrado ainda decidiu que o leilão de um imóvel, em um caso concreto, não excluía o direito do promitente comprador de receber as parcelas pagas.
Já em outro caso de confirmação de jurisprudência, ele validou a quitação plena e geral, firmada em acordo extrajudicial, para impedir investida judicial voltada à ampliação da verba indenizatória.
Em casos de imóveis adquiridos após a Lei 13.465/2017, o relator decidiu que as taxas associativas devem ser pagas se houver registro do contrato-padrão no cartório de imóveis ou anuência do proprietário.
Por fim, Sanseverino relatou o caso no qual o STJ novamente invalidou a taxa de ocupação ou fruição após o desfazimento de promessa de compra e venda de lote não edificado, pois a resilição não gera qualquer enriquecimento do comprador ou empobrecimento do devedor. (ConJur)