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Morre aos 103 anos o cientista britânico James Lovelock, o profeta do clima

Lovelock se apresentou como um 'cientista independente' e criou polêmica com uma visão apocalíptica da crise climática. (Foto: Reprodução)

O cientista britânico James Lovelock, conhecido por seus alertas precoces sobre a crise climática, morreu na terça-feira (26), dia de seu aniversário de 103 anos. Lovelock deixa a esposa, Sally, e os filhos Christine, Jane, Andrew e John.

Ao longo de sua carreira, Lovelock se apresentou como um “cientista independente” e criou polêmica com uma visão apocalíptica da crise climática.

“É tarde, tarde demais para salvar o planeta como o conhecemos”, disse ele à AFP em 2009, alguns meses antes da conferência climática de Copenhague (COP15), que terminou em fracasso.

“Preparem-se para grandes perdas humanas”, costumava dizer, posição então minoritária no mundo científico.

A família informou que a saúde de Lovelock se deteriorou após uma queda recente. Até seis meses atrás, segundo os parentes, o cientista “ainda era capaz de caminhar ao longo da costa, perto de sua casa em Dorset, e dar entrevistas”.

“Para o mundo, ele era mais conhecido como pioneiro científico, profeta climático e idealizador da teoria de Gaia”, disse a família em um comunicado na quarta (27). “Para nós, ele era um marido amoroso e um pai maravilhoso com um senso de curiosidade sem limites, um senso de humor travesso e uma paixão pela natureza.”

Carreira

Lovelock, nascido em 1919, cresceu no sul de Londres no período entreguerras e trabalhou para o Instituto Britânico de Pesquisa Médica por 20 anos. Alguns de seus experimentos analisaram o efeito da temperatura em organismos vivos e envolviam congelar hamsters e depois descongelá-los. Os animais sobreviveram.

No início dos anos 1960, ele foi contratado pela Nasa e se mudou para a Califórnia para trabalhar na possibilidade de vida em Marte, mas passou grande parte de sua carreira como cientista independente, fora das grandes instituições acadêmicas.

Suas contribuições para a ciência ambiental incluíram o desenvolvimento de um detector de captura de elétrons altamente sensível para medir clorofluorcarbonos (CFCs), que destroem a camada de ozônio na atmosfera e poluentes no ar, solo e água.

Lovelock ficou conhecido por ter formulado a “hipótese de Gaia”, em 1970, junto com a cientista americana Lynn Margulis. A hipótese apresenta a Terra como um sistema complexo capaz de se autorregular que criava e mantinha as condições para a vida no planeta. Os cientistas diziam que a atividade humana desequilibrou o sistema perigosamente. A teoria foi criticada por colegas na época.

Lovelock usou livros, discursos e entrevistas para alertar sobre a desertificação, a devastação agrícola e as migrações em massa que as mudanças climáticas trariam.

O apoio de Lovelock à energia nuclear e suas críticas às energias renováveis – ele declarou em 2009 que elas “não tinham o menor impacto na luta contra o aquecimento global” – chocaram ambientalistas.

“A oposição à energia nuclear é baseada no medo irracional alimentado pela ficção ao estilo de Hollywood, os lobbies verdes e a mídia”, escreveu o cientista em 2004. “Esses temores são injustificados, e a energia nuclear desde seu início em 1952 provou ser a mais segura de todas as fontes de energia”.

O Museu de Ciência de Londres homenageou o cientista na quarta-feira (27), “Jim Lovelock estava décadas à frente de seu tempo ao pensar sobre a Terra e o clima, e sua abordagem única foi uma inspiração para muitos”, disse a Dama Mary Archer, Presidente do Conselho de Curadores do Science Museum Group.

O último livro de Lovelock, “Novacene”, publicado quando ele completou 100 anos em 2019, propôs que os humanos serão substituídos na Terra por ciborgues.

Em entrevista à AFP em junho de 2020, Lovelock chegou a relativizar a pandemia da Covid-19, que “mata principalmente os da minha idade – os mais velhos – e já são muitos”.

“A mudança climática é mais perigosa para a vida na Terra do que quase qualquer outra doença concebível”, disse.

Em entrevista ao jornal britânico “The Guardian” em 2020, o cientista afirmou que “a biosfera e eu estamos no último 1% de nossas vidas”.

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