O ator e humorista Paulo Gustavo, que estava internado com covid-19 desde o dia 13 de março em um hospital do Rio de Janeiro, morreu na noite de terça-feira (4) aos 42 anos em decorrência da doença. Seu caso não é isolado: levantamentos recentes apontam que a covid tem avançado entre a população mais jovem no Brasil, com aumento de casos e mortes.
Boletins epidemiológicos do Observatório Covid-19 da Fiocruz, publicados em março e abril, mostram que a pandemia “rejuvenesceu” desde o começo de 2021. Entre a primeira semana de janeiro e a de abril, a faixa etária de Paulo Gustavo, entre 40 e 49 anos, e a de 30 a 39 anos apresentaram a maior taxa de crescimento de notificações de covid-19: 1.218%. Considerando toda a população, os casos da doença dispararam 702%. O crescimento também superou a média entre jovens de 20 a 29 anos (741%) e entre adultos de 50 a 59 anos (1.145%).
No mesmo período, o grupo abaixo de 60 anos foi o que registrou maior aumento de óbitos pela covid-19. O destaque foi a faixa etária entre 40 e 49 anos, com número de mortes 881% maior em abril do que na primeira semana de 2021. Adultos entre 50 e 59 anos (877%), jovens entre 20 e 29 anos (873%) e pessoas de 30 a 39 anos (814%) também tiveram taxas muito acima do aumento da média geral observada no período, de 469%.
Também foi registrada uma mudança no perfil dos hospitalizados: em março, pessoas com menos de 40 anos se tornaram maioria entre os pacientes com covid-19 em UTIs no Brasil. A faixa etária representou 52,2% dos internados no mês, segundo levantamento da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib).
Ainda de acordo com a pesquisa, a admissão de pacientes com até 45 anos de idade em UTIs cresceu 11% entre os períodos de setembro a novembro de 2020 e fevereiro e março de 2021, enquanto a de pessoas acima de 80 anos caiu 27,6%. O levantamento da Amib contempla dados de 20.865 das cerca de 54 mil UTIs no Brasil.
Jovens adultos mais expostos
Marcelo Otsuka, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), destaca que os jovens adultos são mais expostos à doença:
“São pessoas que saem para trabalhar e algumas infelizmente saem para festas, porque se sentem seguras. A variante P1 também pode ter uma contribuição para uma gravidade maior da doença, mas ainda não foi provado”, afirma o coordenador do comitê de infectologia pediátrica da SBI e vice-presidente do Departamento de Infectologia da Sociedade de Pediatria de São Paulo.
Para a pneumologista Margareth Dalcolmo, pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, três fatores explicam o crescimento de contaminações e óbitos entre jovens: além da maior exposição nessa faixa etária, ela cita o avanço da vacinação de idosos em todo o País.
“As populações de mais idade já foram vacinadas, o que já causou um impacto muito positivo nas hospitalizações dessas faixas etárias e, portanto, no número de mortes”, afirma a pesquisadora. “A agilidade da vacinação tem que aumentar muito, cobrir rapidamente as faixas etárias mais jovens. Mas vacina não é bala de prata. É preciso continuar se cuidando: mesmo com o imunizante, os jovens não apenas podem se contaminar como também podem transmitir o vírus.
Otsuka ressalta que os mais jovens costumam ficar mais tempo internados do que idosos — que muitas vezes morrem mais rapidamente pela doença — o que contribui para a maior lotação das UTIs. Ele também afirma que alguns adultos atrasam a procura por atendimento médico, o que pode aumentar o risco de apresentar complicações.
“Não conseguimos analisar o quanto isso influencia nos números atuais, mas muitos adultos mais jovens, por medo de ir ao hospital ou porque se sentem seguros de que não vai acontecer nada sério, acabam atrasando a procura por tratamento”, explica o infectologista. “Os tratamentos para a covid-19 são muito restritos, de suporte, mas se a pessoa não começa logo, tem maior chance de complicações e até de mortalidade. Não se deve ficar passando mal em casa.”