Sábado, 28 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 17 de janeiro de 2023
Desde que perdeu as eleições, Jair Bolsonaro (PL) vive em um silêncio episodicamente interrompido por discursos com mensagens cifradas e sem referências diretas à situação do País que deixou, nos dias finais de seu mandato, rumo aos Estados Unidos. A partir da posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ele se limita a publicar feitos do próprio governo nas redes sociais.
Enquanto isso, no Brasil, a ala mais radical de seus apoiadores promoveu atos de vandalismo contra as sedes dos três Poderes, em Brasília, provocou uma reação dura dos mesmos e acuou o movimento de seguidores do ex-presidente. Na classe política, movimentos dúbios deixam no ar algumas questões: quem herdará, disputará ou mesmo se há um espólio do bolsonarismo em jogo.
Um dia após os ataques em Brasília, Lula reuniu governadores ou representantes das 27 unidades federativas para uma reunião que teve como mote o compromisso dos líderes estaduais com a defesa da democracia no país. Mesmo os nomes mais ligados ao bolsonarismo compareceram ao encontro e fizeram parte de uma caminhada simbólica com o petista, saindo do Palácio do Planalto até o Supremo Tribunal Federal (STF). Ambos os prédios ainda com as marcas da destruição recente.
Correligionário e apoiador do ex-presidente, Cláudio Castro (PL) e o ex-ministro de Bolsonaro Tarcísio de Freitas (Republicanos), governadores do Rio de Janeiro e São Paulo, respectivamente, estenderam a agenda na capital federal e tiveram encontros com Lula. “Não teve constrangimento nenhum […] Falei que com certeza estaremos juntos”, disse o governante fluminense depois de conversar com o petista na terça-feira (10). Um dia depois, foi a vez de Tarcísio, que comentou sobre a reunião: “Fui eleito por uma base bolsonarista, mas agora eu tenho que governar para todos, então é natural que eu converse com o presidente da República”.
Romeu Zema (Novo) esteve na reunião dos governadores, mas não teve uma agenda exclusiva com Lula. Assim como os outros governadores do Sudeste aliados a Bolsonaro, o mineiro também repudiou os atos de violência na capital federal, mas não deixou de fazer acenos ao eleitorado bolsonarista.
Para o cientista político Adriano Cerqueira, professor da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e do Ibmec, Zema e Tarcísio estão entre os nomes mais bem cotados para liderar o eleitorado bolsonarista em 2026 e, por isso, eles têm adotado uma postura cautelosa diante da violência ocorrida em Brasília.
“Eles precisam ficar próximos de Bolsonaro e principalmente do eleitorado. Podem até criticá-lo, como Zema costuma fazer, mas respeitando os valores políticos do grupo. O cuidado que eles vão precisar, ao mesmo tempo em que repudiam os atos de vandalismo, saber defender esse eleitorado que está sob ataque, sendo chamado de terroristas e golpistas. É um momento em que este eleitorado está muito sensível a quem os apoia, por isso é fundamental. O Tarcísio mesmo anunciou que não iria se encontrar com Lula, aí voltou atrás e foi. Eles estão tateando o terreno. O Zema deve estar aguardando o melhor momento para conversar com o presidente. Talvez o novo Congresso assumir e a situação política se normalizar um pouco mais”, avalia.
Cerqueira acredita que o nome do senador eleito e ex-vice-presidente de Bolsonaro Hamilton Mourão (Republicanos-RS) é mais controverso dentro do eleitorado bolsonarista. Com histórico de contradições em relação ao antigo companheiro de chapa, o general da reserva, no entanto, manifestou preocupação com os apelos de mais de 1,5 mil manifestantes presos após vandalismo na capital federal.
“A detenção indiscriminada de mais de 1.200 pessoas, que hoje estão confinadas em condições precárias nas instalações da Polícia Federal, em Brasília, mostra que o novo governo, coerente com suas raízes marxistas-leninistas, age de forma amadora, desumana e ilegal. O Brasil e as pessoas detidas esperam ações rápidas dos nossos parlamentares em mandato e das verdadeiras entidades ligadas aos direitos humanos”, escreveu Mourão em seu perfil no Twitter.
O professor da Ufop salienta que a formação do eleitorado bolsonarista faz parte de um movimento alheio à figura do ex-presidente, mas com valores que costumam alijar do jogo político quem tenta conquistá-lo em meio a críticas a Bolsonaro. Isso deve ser levado em conta por quem tenta esse voto.
“Nós temos um crescimento do conservadorismo no Brasil, isso acontece por razões como o envelhecimento da população. As pessoas quando ficam mais velhas ficam mais presas a tradições e também com o crescimento do eleitorado evangélico e há uma tendência de eles abraçaram o conservadorismo. Por conta disso, Bolsonaro é muito mais uma consequência do que uma causa. Ele conseguiu saber representar esse eleitorado. Outros políticos que tentaram pegar esse eleitorado de centro-direita e direita, mas fazendo oposição a Bolsonaro, como João Dória (PSDB-SP) e o próprio Sérgio Moro (União Brasil-PR) perderam esse eleitorado”, destaca.