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Colunistas Não dá pra ser feliz

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Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, divulgada pelo IBGE. (Foto: EBC)

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

“Um homem se humilha, se castram seus sonhos. Seu sonho é sua vida, e vida é trabalho. E sem o seu trabalho, o homem não tem honra, e sem a sua honra, se morre, se mata”, cantava Gonzaguinha nos anos 80, desvelando a expressão tensa e dramática de alguém desprovido do direito ao trabalho”.

De todos os problemas futuros que surgirão da atual pandemia da Covid-19, talvez o mais trágico e potencialmente perigoso seja a legião de desempregados que advirá desse momento que o nosso País e a humanidade atravessam. Hoje, já são quase 13 milhões de brasileiros sem emprego, e projeções estimam que esse número poderá chegar próximo de 20 milhões até o final deste ano.

O impacto e a importância do trabalho vão muito além dos aspectos econômicos, pois afetam diretamente a vida, os sonhos e as expectativas das pessoas. Sem trabalho, ocorre o aviltamento da autoestima, o aumento da ansiedade e do medo,  num angustiante processo de adoecimento do corpo e da alma, com sequelas dolorosas e profundas.

Inicialmente tido como fonte de subsistência, o trabalho já foi “tripalium”, dor, castigo e maldição, sendo tarefa de escravos na Grécia de Aristóteles. Mais tarde, no século XVI, sob Calvino, houve a sua ressignificação, agora não mais como uma maldição, mas uma benção, vindo a calhar mais tarde com a ética protestante de Max Weber, que finalmente justificou e deu sustentação moral ao trabalho devotado e dedicado exigido pelo capitalismo.

Essa brevíssima contextualização nos remete ao atual status do trabalho, em toda a sua simbologia, perante o sentido ético que historicamente situou o homem como sujeito de sua própria história.

Nessa perspectiva, para além do gravíssimo drama que cada trabalhador experimenta ao perder seu emprego, assistimos à conjugação de dois fenômenos coincidentes e que devem moldar a situação com reflexos ainda mais preocupantes nos próximos anos. De um lado, uma possível depressão provocada pela pandemia da Covid-19 projeta enxugamentos e demissões em massa, não obstante o esforço dos governos para que isso seja minimizado com programas de apoio. De outro, novas tecnologias ceifam milhares de empregos a uma velocidade inaudita, gerando uma horda de inúteis, nas duras palavras do historiador israelense Yuval Harari.

O que fazer diante desse quadro, no qual assomam também no horizonte as ameaças de instabilidade social profunda, ante-sala histórica de ruptura do próprio tecido social? A fome, unida à perda da dignidade subtraída pelo desemprego, tornam destemidos, cidadãos antes pacatos. A indigência social, fruto do desemprego, carrega sementes cuja indiferença dos governantes pode ensejar um sério estremecimento da estabilidade social. Isso é particularmente mais grave no Brasil, cujo abismo social e pobreza extrema tornam o quadro geral ainda mais desafiador. Garantir trabalho e renda para a enorme massa de brasileiros desempregados é a responsabilidade maior do Governo neste momento, seja através de amplas frentes de trabalho, seja pela garantia de uma renda mínima para os desempregados até que a economia volte ao seu curso normal.

Precisamos, mais do que em qualquer tempo, olhar de forma diferente para   nossos desempregados, despossuídos e miseráveis. O desemprego, a indigência e a miséria, não são apenas economicamente negativos, mas sobretudo, moralmente inaceitáveis. Trata-se de uma dívida histórica da Nação, cuja indesculpável omissão ao longo do tempo nos legou esse inevitável enfrentamento. Sem isso, não dá pra ser feliz!

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

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