Olhei para a imagem, confirmei com segurança que era religiosa.
Senti certa vergonha, pela minha fé inconstante. Chegou-me uma dúvida que me inquietou.
Talvez eu não tivesse crédito.
Crédito de fé, que nasce e se consolida na crença que não vacila.
Me apercebi que andara tão dominado, submetido mesmo, e desfrutando os poderes do ministério, do governo, que tanto eu pedia, que tanto deveria fazer pelos outros. Cada ajuda, cada exercício de poder que me envolvia acreditava na Justiça: estava fazendo pelos outros. Enfim, era ajuda quase sublime. A confirmação do poder que, de verdade, eu não tinha, mas que me convencera de estar em minhas mãos. Será que essa – agora tenho o desafio de pintá-la – é a vida que pedira a Deus?
Será que pedira mesmo?
Tu sabias que também, como todos, és frágil? Ou dúvidas?
E quem faz por ti?
Serás tão poderoso que não precisas pedir; ou talvez não saibas pedir?
Fiz um esforço. Levantei a cabeça e vi, mesmo com a imagem deformada, que ainda estava lá ou ali. Ali ou lá. Mas estava. Ocupava uma ponta do corredor. Todos, de mãos dadas. Senti um tranco e as rodas da padiola começaram a girar.
Tive a impressão que secavam, juntos, os olhos. Seguramente, pensavam que eu, tão perto e tão distante, não veria suas lágrimas. Tinham razão, seguindo um pensamento racional; mas, não sei bem como, as sentia.
E as sentia de verdade.
Foi então que a padiola fez toda sua curva. E agora não iria procurá-los porque sabia que não os encontraria mais. Passei a palma da mão nos olhos. Mais de uma vez. Molhados. Muito molhados. Eu estivera chorando. Ou melhor: estava chorando. Como eu era frágil: me escondera para chorar.
P.S. Inspirada numa crônica feita há 33 anos.