Quarta-feira, 05 de março de 2025
Por Redação O Sul | 2 de setembro de 2022
A tuberculose era a principal causa infecciosa de morte antes da chegada da Covid-19, responsável por 1,5 milhão de vítimas por ano. No entanto, cerca de 5% dos casos são resistentes aos medicamentos utilizados hoje, o que dificulta o tratamento. Uma nova terapia chamada BPaL – que combina os antibióticos bedaquilina, pretomanida e linezolida – chegou a ser aprovada em 2019 pela agência reguladora dos Estados Unidos, com mais de 90% de eficácia, mas a grande quantidade de efeitos colaterais era um entrave para o uso. Agora, pesquisadores encontraram uma solução para o problema.
Segundo uma série de estudos de 2020, o tratamento com o BPaL é ligado a uma alta taxa de queixas como dores nos nervos, depressão espinhal ou registros de diminuição na produção de células responsáveis pela imunidade, consequências devido à presença da linezolida. Porém, um estudo recém-publicado na revista científica New England Journal of Medicine mostrou que a dose utilizada de linezolida pode ser cortada pela metade, reduzindo drasticamente os efeitos, mas sem mudanças significativas na eficácia da terapia.
Os resultados são de um ensaio com 181 pacientes com tuberculose resistente em países como Rússia, África do Sul e Geórgia, que concentram as maiores taxas da doença no mundo. A conclusão é que, enquanto 1.200 miligramas de linezolida (dose original) por seis meses foi 93% eficaz, uma dose de 600 miligramas no mesmo período manteve 91% de eficácia – sem grandes alterações.
No entanto, a dosagem pela metade levou o número de participantes com supressão da medula óssea decorrente do tratamento a reduzir de 22% para apenas 2%. Entre os que sofrem de neuropatia periférica (causando dor no nervo), a diminuição foi de 38% para 24%
“Este é o começo do fim da tuberculose resistente aos medicamentos. Quanto mais rápido você trata a tuberculose de uma pessoa, menos contagiosa ela é. É como a Covid em muitos aspectos”, afirma a principal autora do estudo, Francesca Conradie, da Universidade de Witwatersrand, na África do Sul.
A tuberculose é uma doença infecciosa transmissível causada pelo bacilo Mycobacterium Tuberculosis que afeta o pulmão causando quadros de falta de ar, tosse e fadiga. O tratamento padrão dura geralmente seis meses, e é efetivo contra a doença. O problema é que cada vez mais são registrados casos de tuberculose resistente, quando o microrganismo não responde aos antibióticos convencionais.
O novo tratamento com o BPaL foi um sinal de esperança para o médico ucraniano Volodimir, de 25 anos, que preferiu não revelar seu sobrenome. Com um quadro de tuberculose resistente, ele antes seguia uma estratégia quase duas vezes menos eficaz, que envolvia tomar mais comprimidos, causava diversos efeitos colaterais neurológicos e não havia conseguido solucionar o problema.
Com a nova medicação, os sintomas desapareceram. Além disso, o BPaL durou apenas seis meses, contra dois anos do tratamento anterior. No dia da última dose, um exame mostrou que não havia mais vestígios da bactéria resistente causadora da tuberculose.
“Agora, posso começar a viver de novo”, disse o médico, que pretende voltar ao trabalho na próxima semana depois de oito meses afastado.
OMS atualizará diretrizes
A duração mais curta é de fato um diferencial na nova terapia pois facilita a adesão dos pacientes. Antes, além de menos eficaz, a estratégia envolvia até 23 comprimidos por dia durante dois anos – chegando a um total de 14 mil unidades ao longo do tratamento. Já o BPaL consiste em apenas cinco comprimidos por dia em seis meses – um total de menos de 750 unidades.
Para Natalia Lytvynenko, que supervisionou o tratamento com o BPaL na Ucrânia, o número mais gerenciável de pílulas facilita também o acompanhamento médico com os pacientes, especialmente aqueles deslocados pela guerra.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmou que atualizará as diretrizes para recomendar a nova terapia com 600 miligramas de linezolida para a maioria dos pacientes com tuberculose resistente. Dois especialistas na área, não envolvidos no estudo, concordaram que se trata de “grandes avanços” na área.
“É um dos avanços que definem a pesquisa científica da tuberculose neste século”, escreveu Guy Thwaites, da Universidade de Oxford, e Nguyen Viet Nhung, do Programa Nacional de Controle da Tuberculose do Vietnã, em um editorial publicado no New England Journal of Medicine.