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Novas gerações rejeitam o termo “turista” e se dizem “viajantes”

Diferença, muitas vezes, está apenas no próprio rótulo. (Foto: Reprodução de internet)

Nada de contratar guia ou fazer selfie na torre Eiffel. Coisa de turista, nem pensar. Essa vontade de fazer diferente da maioria não tem nada de novo – ou de original. Mas a aversão ao rótulo de turista, usado às vezes como se fosse sinônimo de viajante desinformado, predador e de comportamento bovino, foi amplificada com a mudança na forma de viajar das novas gerações, dizem especialistas.

“O termo ‘turista’, infelizmente, tem sido utilizado nos últimos anos de uma forma pejorativa. Isso é tão forte mundialmente que muitas empresas do setor preferem não usá-lo mais”, disse Mariana Aldrigui, professora do curso de turismo.

A palavra da vez no ramo é “experiência”. Por meio dela, tenta-se transmitir a ideia de viagem que explora o destino de forma profunda, pela perspectiva de quem mora nele. Em vez de assistir da janelinha de um ônibus a como as pessoas vivem em determinada cidade, os turistas agora querem viver como elas, disse Trícia Neves, sócia-diretora de uma consultoria especializada em turismo.

Esse desejo é capitaneado pelas chamadas gerações Y e Z – dos nascidos entre 1979 e 1993 e entre 1994 e 2010, respectivamente. Esses jovens, sobretudo os mais novos, buscam de forma incessante experiências que consideram autênticas, segundo Stefano Arpassy, da consultoria WGSN.

“É um consumidor que exige transparência e quer sentir a verdade das coisas”, completou Trícia Neves. Na visão desse público, tudo aquilo que é construído com o intuito de atender ao turismo tem seu valor reduzido e adulterado. Se um restaurante está cheio de turistas, é porque não deve ser bom – além de, provavelmente, cobrar mais caro pelo serviço. O que é considerado como genuíno, então, é só o que é feito e frequentado por moradores.

A palavra turista tem sua origem no termo francês “tour”. De acordo com Thais Nicoleti, consultora de língua portuguesa, o termo tem adquirido a conotação de indivíduo superficial e ingênuo, que vai aos piores lugares pagando os maiores preços.

O turista é visto, ainda, como um destruidor em potencial, que anda sempre em grupos, conduzido por um guia. Nicoleti lembra que, de uns tempos para cá, nos textos da imprensa, se tornou comum a expressão “hordas de turistas”, o que ajuda a intensificar essa visão negativa. Muitos dos que viajam querem se distanciar desse rótulo e se consideram “viajantes”.

A palavra remete aos exploradores naturalistas dos séculos 17 e 18, afirmou Wilker Nóbrega, professor da pós-graduação em turismo.  “O viajante daquela época tinha o propósito de adquirir conhecimento, interagir com as pessoas e entender o lugar com profundidade. E esses novos turistas estão procurando voltar a essas raízes”, destacou.

A professora Kesia Juliane dos Santos, de 27 anos, se identifica com a descrição. “Eu me considero mais uma viajante por gostar muito de elaborar o meu roteiro e de fazer todas as coisas por conta própria”, afirmou. Ela disse que quase sempre viaja sozinha e costuma se hospedar em hostels ou na casa de moradores, no esquema de couchsurfing (aluguel de quarto ou de sofá). Além de conseguir economizar, Kesia afirma se sentir, assim, mais imersa na cultura local.

A professora ressalva que considera importante, também, visitar os pontos considerados turísticos – aqueles lugares em que “todo o mundo” vai. “Só não deve ser a única motivação que leva a pessoa a viajar”, explicou.

O problema surge quando o turismo em excesso começa a descaracterizar a cidade e prejudicar seus habitantes, o que ficou conhecido como “overtourism”. O termo é usado para descrever a situação na qual se encontram cidades como Veneza e Amsterdã.

Veneza proibiu navios de cruzeiro de circular no centro histórico e aprovou o banimento de turistas com mau comportamento, como urinar na rua ou nadar em canais. A partir de janeiro do ano que vem, a Prefeitura de Veneza vai passar a cobrar uma taxa aos visitantes que não pernoitarem na cidade. Já Amsterdã tem um programa para incentivar a abertura de restaurantes – para turistas – afastados de pontos turísticos.

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