O carnaval é um dos períodos mais aguardados do ano por brasileiros e muitos turistas. A libido dos foliões durante os blocos pode atingir graus mais altos do que o calor registrado nos últimos dias. Somam-se a isso o consumo de álcool e outras substâncias, além de uma certa permissividade social que é muito presente nos bloquinhos. Mas será que, na prática, tudo é realmente liberado?
É importante conhecer o que diz a lei para evitar transtornos e garantir que você possa aproveitar o carnaval sem problemas. Para entender melhor o que é ou não permitido durante o carnaval, Thayse Pozzobon e Melina Fachin, advogadas especializadas em direito penal e direitos humanos, explicam quais são as possíveis implicações para cada tipo de situação durante o carnaval.
É crime ser pega fazendo sexo em público no Carnaval?
Sim. “No Brasil, de acordo com o Artigo 233 do Código Penal, a prática de atos sexuais em público pode ser enquadrada como crime de ato obsceno, independentemente do contexto festivo”, explica Fachin. Isso inclui sexo com penetração, sexo oral e masturbação em ruas, praças, dentro de carros estacionados em locais visíveis ao público ou no meio à multidão dos blocos de Carnaval.
Caso resolva ceder à fantasia e dar uma rapidinha ao som de “minha pequena Eva”, a história pode acabar em boletim de ocorrência. A pena varia de três meses a um ano de detenção ou multa, caso seja visto por uma autoridade ou alguém te denuncie. As pegações mais intensas podem passar despercebidas, desde que precedidas de consentimento e feitas de uma maneira mais reservada.
Posso mostrar os seios ou outras partes íntimas durante o bloco?
Depende. O topless pode até ser comum em alguns blocos ou fantasias que mostram parcialmente os mamilos, mas é bom ter cuidado. Pozzobon afirma que a exposição dos mamilos, vulva ou pênis durante o bloco ou desfile de carnaval pode configurar crime de ato obsceno em algumas situações. “Tudo vai depender da autoridade que presenciar a cena e do contexto, já que o dispositivo legal não explicita a prática como um crime.”
No entanto, segundo Fachin, enquadrar mulheres mostrando os seios pode ser interpretado de forma machista pela lei. “Mesmo que não haja uma proibição legal expressa, pode gerar abordagens policiais mal intencionadas”, afirma.
É permitido fazer xixi ou praticar golden shower em público?
Não. Nada de transformar a rua no seu banheiro particular. “Fazer xixi em vias públicas pode configurar infração administrativa, sujeita a multa em cidades que possuem a regulamentação específica”, alerta Fachin. Não adianta usar a desculpa que não tinha banheiro químico por perto.
“Já as práticas sexuais que envolvam urina, como o golden shower, se realizadas de forma visível ao público, também podem ser enquadradas como ato obsceno”, alerta Fachin.
O que o STF pensa sobre a prática de atos obscenos?
O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a repercussão geral sobre a constitucionalidade da prática de ato obsceno em local público. Em outras palavras, afirma que a maioria das acusações são casos considerados atípicos, então não se tem uma definição legal do que seria considerado crime.
Segundo Pozzobon, o que acontece no Carnaval é que as autoridades não conseguem ter conhecimento de todas as práticas ocorridas nos blocos que podem ser enquadradas no artigo 233. “De certa maneira, ainda existe uma aceitação social para algumas condutas ocorridas no contexto festivo, desde que precedidas de consentimento.” Mas isso muda quando o crime ocorrido é relacionado a abuso sexual.
Qualquer tipo de importunação sexual é crime
Se qualquer um dos atos descritos acima for feito sem consentimento, é crime! Passar a mão sem permissão, beijar alguém à força, esfregar as partes íntimas em alguém sem consentimento, são atos considerados crime de importunação sexual, de acordo com o artigo 215-A. A punição pode variar de um a cinco anos de reclusão.
Outro crime grave que pode ocorrer durante a folia é o estupro, previsto no artigo 213 do Código Penal. Aprenda que não é não — qualquer insistência além disso é crime. Forçar uma relação sexual sem consentimento pode resultar em uma pena de seis a dez anos de prisão, podendo ser maior se for fatal ou houver lesão corporal. Se você for vítima ou presenciar qualquer tipo de abuso sexual durante o bloco, é essencial buscar ajuda. Denuncie para a polícia e procure um posto de atendimento para receber os cuidados necessários.
Fachin destaca que mesmo que o Carnaval seja um momento de festa e liberdade, isso não quer dizer que os corpos das pessoas são territórios públicos. “É fundamental que o direito ao prazer e à celebração não seja confundido com permissividade para desrespeito e violência”, aponta.