Quinta-feira, 16 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 23 de abril de 2018
O BC (Banco Central) reuniu o setor de cartões de crédito para dizer o que quer em termos de taxas e prazos e espera que os resultados apareçam na virada do ano. Em entrevista ao Valor, o diretor de Política Monetária do BC, Reinaldo Le Grazie, afirma que a agenda é composta por três vetores: a migração para um modelo com prazo de liquidação mais curto para o estabelecimento comercial, hoje ao redor dos 30 dias; taxas de juros mais baixas para o consumidor; e a redução na taxa de intercâmbio – paga pelo credenciador ao emissor do cartão.
“Ao invés de regular essa mudança de modelo de negócio, que é complicado pois o modelo existe há 30 anos, o que estamos fazendo é deixando claro para o mercado que precisamos da evolução desses três tópicos”, diz. “É nesse sentido que estamos caminhando no cartão de crédito.”
Essa forma de atuação, de dar um norte para o mercado no lugar de usar o poder da “caneta” do regulador, já tinha sido evidenciada pelo presidente do BC, Ilan Goldfajn, em audiência na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos do Senado) quando disse que o tradicional parcelado sem juro no cartão não iria acabar. “A ideia toda é a mercado, não vamos forçar nada, se alguém quiser oferecer outro produto, pode oferecer”, disse Ilan.
De acordo com Le Grazie, o mercado vai trabalhar para oferecer produtos com essas características delineadas pelo BC. E que não é preciso excluir nenhum outro modelo de negócio já existente. “As reuniões no começo da semana foram para isso. Deixar claro que o BC quer ver o mercado caminhar para esse modelo”, diz o diretor.
Para Le Grazie, o mercado tem de andar mais ou menos junto na modernização dos modelos de negócios, desenvolvendo tecnologia em conjunto. “Fica mais barato do que iniciativas isoladas. A infraestrutura tem de ser compartilhada”, afirma.
Segundo o diretor, o mercado de cartões no Brasil é bastante desenvolvido e funciona bem. “Nós queremos que a indústria continue crescendo. Mas que o cartão de débito seja mais um instrumento de pagamento e o cartão de crédito seja mais instrumento de crédito.”
No mercado de débito, o objetivo é popularizar ainda mais e aumentar a participação, substituindo o dinheiro. O BC vai fazer campanhas publicitárias chamando atenção para isso.
Ainda na modalidade débito, o diretor afirma que o BC vai incentivar novas tecnologias, como pagamento sem senha para valores baixos, pagamento via smartphone e pagamento sem contato ou por aproximação.
O BC já limitou a taxa de intercâmbio no cartão de débito, medida que terá validade em outubro. Esta, sim, tomada via “caneta”, pois a estrutura vigente não levaria à redução espontânea desse componente do custo.
Segundo Le Grazie, a expectativa é que a redução de custo seja repassada para o estabelecimento comercial que passaria, também, a sugerir mais o uso desse meio de pagamento ao consumidor.
“Tanto no débito quanto no crédito é fundamental que os modelos sejam transparentes para o consumidor. Ele tem de ter noção do preço à vista e a prazo. Esse é o mote no BC, que os estabelecimentos deem transparência para os preços e deixem claro as alternativas aos consumidores. Isso é fundamental”, explica.
A agenda toda, tanto no débito quanto no crédito, busca a redução dos subsídios cruzados que existem dentro do sistema, que envolve bancos, bandeiras, credenciadores e subcredenciadores e, assim, reduzir também o custo para na ponta do consumo. A expectativa do BC é que a diminuição desses subsídios cruzados promova a entrada de novas empresas no mercado, que ainda é bastante verticalizado, com os grandes bancos operando em todas as etapas. Ações nesse sentido já foram tomadas, como a quebra de exclusividades e a adoção da liquidação centralizada.
Depois das recentes mudanças no mercado de cartão de débito e do estímulo à autorregulação para o cheque especial, Le Grazie afirma que o BC não tem nenhuma outra medida do tipo em estudo. Mas o diretor chama atenção para um novo participante de mercado que, na sua avaliação, pode deixar o crédito mais seguro e barato.
São as chamadas registradoras de recebíveis, que vão fazer o registro de duplicatas e outros tipos de recebíveis, como de cartão de crédito, deixando operações mais seguras. “Se não vão revolucionar, vão trazer muita eficiência ao mercado”, diz, lembrando que o BC já avalia pedidos de atuação de empresas desse tipo.
O registro do recebível em ambiente único garante que não haja risco de dupla utilização, além de permitir ao comerciante, por exemplo, fazer uma oferta das contas que tem a receber em ambiente público, conseguindo melhores taxas de antecipação.
Não só no caso dos cartões, mas também dos pagamentos instantâneos, das registradoras de recebíveis e das empresas de tecnologia financeira, Le Grazie diz que o papel do BC é prover um arcabouço regulatório mais aberto e competitivo possível para que todos possam participar.