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O Brasil é um país birracial ou mestiço?

O IBGE divulgou os resultados do censo de 2022. No quesito raça/cor da pele não há grandes novidades. Os números evidenciam um padrão histórico de pequenas alterações, às vezes definidas por certas mudanças de metodologia. Como é comum na questão racial, cada estudioso faz a sua leitura e dá a sua interpretação dos números.

Os movimentos identitários, por exemplo, concluíram desde logo que houve um aumento do número de negros no Censo e que pela primeira vez os negros agora se constituem na maioria da população brasileiro. Há controvérsias.

Na verdade, o formulário de pesquisa do IBGE não contempla a categoria de “negros”. A pergunta sobre esse item é bastante simples: como o pesquisado se vê? A autodeclaração, portanto, é que manda e assim é computada. Não é um censo sobre raça mas sobre a cor da pele.

Para o IBGE as categorias são preto, pardo, branco indígena, amarelo. Assim, ninguém pode se declarar “negro”. Nas estatísticas de 2022, 45,3% se declararam pardos e 10,2% se declararam pretos. Os brancos são 42,8%. Então os negros só podem ser considerados maioria se os pardos forem incluídos nessa condição.

Dá para constatar desde logo a incongruência, Como maioria (de negros) se 45% se identificaram como pardos? Se quisessem se tomar como pretos, teriam assim declarado.

Dizendo de outro modo: se o que vale é a autodeclaração, então ninguém pode – ou não deveria – reclassificar a seu critério e juízo o que o pesquisado diz. É um tanto elementar: os pardos querem dizer que são o resultado de uma mistura de cores da pele, e seus ascendentes são, por exemplo, pretos e brancos, brancos e indígenas, ou indígenas e pretos.

Talvez uma tal abordagem não deveria merecer uma dimensão de relevância. Mas não é assim. Os movimentos negros, por exemplo, tem todo o interesse em dizer que os negros são maioria : não convêm aos seus formuladores admitir que o Brasil é um país misturado, miscigenado, mestiço, enfim. Miscigenação é genocídio , chegam a dizer.

As consequências são previsíveis. Se somos uma nação birracial, de brancos e negros, então a cor da pele reflete um dado importante para o debate de políticas públicas (como as cotas raciais) e para a formação de uma visão de mundo. Queremos um mundo mais cooperativo entre os seres humanos, independente da cor da pele, ou queremos separá-los por raça, cor e fenótipos, que se detestem e se odeiem? Queremos viver em paz na comunidade, cada um fazendo o melhor para assegurar uma vida decente para todos, ou queremos um mundo em permanente conflito?

Nada disso significa que se deve passar o pano nas desigualdades. De modo algum devemos ignorar que os pretos e pardos, são a parte mais frágil nas relações sociais, os mais excluídos e sofridos, as vítimas preferenciais de um sistema injusto e desigual, os que tombam primeiro nos confrontos com a polícia.

Mas também não há porque privilegiar uma conceituação que acentue os pretextos da discórdia e do ódio racial – inclusive falseando os dados e as evidências – para sobrecarregar no peso das conhecidas assimetrias e tornar os conflitos mais agudos do que são.

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