Quinta-feira, 02 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 29 de dezembro de 2024
O Brics está sob ameaça de sanções dos EUA caso siga adiante com a ideia de substituir o dólar em suas transações comerciais. A advertência veio do presidente eleito Donald Trump, enquanto o Brasil se prepara para assumir a presidência do bloco, no dia 1º. Analistas ouvidos pelo Estadão, porém, veem a ameaça como uma cortina de fumaça.
A mudança é uma ideia antiga na busca por reduzir a dependência do dólar, mas nunca avançou de fato. Nem sequer aparece nas declarações das últimas cúpulas, que focam mais o uso de moedas locais como alternativa à americana.
“Não há projeto concreto para criação de uma moeda do Brics”, diz Oliver Stuenkel analista político e professor de relações internacionais da FGV-SP. “Existem muitos obstáculos. Não é uma proposta que está em vias de ser implementada.”
“Havia sinais prévios de que Trump faria ameaças a países envolvidos em iniciativas que pudessem reduzir a centralidade do dólar no sistema financeiro internacional”, aponta Stuenkel. O que não está claro, afirma, é o que isso significa em termos concretos.
“É uma forma de Trump dar um sinal de alerta para o Brics. Mas o bloco não está discutindo a criação de uma nova moeda. O que tem sido discutido é a possibilidade de comércio em moeda local”, disse Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington.
O efeito, pelo menos no primeiro momento, é de pressão sobre o Brics, o que poderia levar o Brasil a ser mais cauteloso na discussão sobre alternativas ao dólar enquanto preside do bloco.
“O Brasil vai precisar passar uma imagem de moderação, até mesmo por causa das diferenças ideológicas entre os presidentes Lula e Trump”, observa Vinícius Rodrigues Vieira, professor de Relações Internacionais da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP) e da FGV.
Em 2025, o Brasil assumirá a presidência do Brics, bloco originariamente formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, e que foi ampliado pela participação de Arábia Saudita, Irã, Emirados Árabes Unidos, Egito e Etiópia.
A liderança brasileira terá como lema o fortalecimento da cooperação do Sul Global, mas os temas para a Cúpula ainda estão sendo definidos. Procurado pelo Estadão, o Itamaraty não comentou a ameaça de Trump.
A Rússia, por sua vez, advertiu que Trump pode dar um tiro pela culatra. “Cada vez mais países estão aderindo ao uso de moedas nacionais em suas atividades comerciais”, respondeu o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov. “Se os EUA usarem a força econômica para obrigar os países a usar o dólar, isso fortalecerá ainda mais a tendência de mudança para as moedas nacionais.”
A moeda americana, contudo, mantém sua hegemonia apesar dos esforços por diversificação, intensificados com a guerra na Ucrânia. O dólar representa 58% das reservas globais, bem à frente do segundo colocado, o euro, com 20%, segundo o Atlantic Council.
O relatório destaca que o Brics tem promovido o uso das moedas nacionais ao mesmo tempo em que a China expande o sistema alternativo de pagamentos para os seus parceiros comerciais, mas conclui que o papel do dólar como moeda dominante está garantido no curto e médio prazo.
O verdadeiro impacto da política tarifária de Trump recairia sobre os consumidores americanos. São eles que pagam as taxas aplicadas aos produtos importados, não os países de origem.
Para entender o efeito que a política tarifária do republicano teria sobre a renda dos americanos, o Institute on Taxation and Economic Policy (ITEP), centro de estudos com sede em Washington, fez uma projeção com base na proposta de 60% para os produtos chineses e 20% para todas as outras importações. E descobriu que o aumento seria equivalente a 5,7% da renda dos americanos mais pobres em 2026. No caso dos mais ricos, esse número cai para 1,4%. (Estadão Conteúdo)