Domingo, 22 de dezembro de 2024
Por André Charone | 6 de novembro de 2024
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Nos últimos anos, o termo “classe média” tem sido cada vez mais questionado. Antes símbolo de estabilidade financeira e ascensão social, esse segmento vem enfrentando uma dura realidade: a perda de poder de compra e a pressão por um padrão de vida que se torna cada vez mais difícil de sustentar. Afinal, o que aconteceu com a classe média? Quais fatores levaram ao seu enfraquecimento?
Para entender essa transformação, André Charone, contador, consultor financeiro e autor do livro “A Verdade sobre o Dinheiro: Lições de Finanças para o Seu Dia a Dia”, explica os desafios enfrentados por esse grupo e oferece uma análise profunda das causas desse declínio.
O custo de vida escalando rápido demais
Segundo Charone, um dos principais problemas que afetam a classe média é o aumento acelerado do custo de vida, sem que os salários acompanhem essa alta. “Nos últimos dez anos, vimos uma inflação crescente em itens essenciais como alimentação, habitação, educação e saúde, mas os reajustes salariais para a classe média ficaram aquém dessa elevação. Com isso, essa faixa da população passou a ter mais dificuldade em manter o padrão de vida que antes era considerado normal”, explica.
A crise econômica provocada pela pandemia e os choques externos, como a guerra na Ucrânia, apenas intensificaram esse problema. “Famílias que antes podiam pagar por educação particular para os filhos ou manter um plano de saúde de qualidade agora se veem obrigadas a fazer cortes significativos. É um processo de empobrecimento silencioso, onde o padrão de vida se deteriora gradativamente”, alerta Charone.
Endividamento: o círculo vicioso
Outro fator que contribuiu para o enfraquecimento da classe média é o endividamento crescente. Charone aponta que, para manter o estilo de vida, muitas famílias recorreram ao crédito fácil, criando uma bolha de endividamento. “As pessoas se viram entre a necessidade de consumir e a ausência de uma renda que acompanhasse essa necessidade. Isso levou ao aumento de dívidas, principalmente no cartão de crédito e financiamentos”, comenta.
O consultor financeiro ressalta que, em seu trabalho, ele viu casos de famílias que, na tentativa de manter a fachada de estabilidade, acabam comprometendo seu futuro financeiro. “A classe média foi empurrada a financiar seu padrão de vida com crédito, mas sem planejamento adequado, as consequências são devastadoras, como inadimplência e até perda de patrimônio.”
Reforma Tributária: solução ou agravante?
Charone destaca ainda o papel da tributação nesse processo de queda da classe média. “No Brasil, temos uma estrutura tributária que penaliza o consumo, o que atinge diretamente a classe média. Quanto mais essa faixa da população consome, mais tributos ela paga, enquanto os mais ricos, com investimentos e ganhos de capital, acabam se beneficiando de brechas fiscais.”
Ele ressalta a necessidade urgente de uma reforma tributária que seja mais justa e redistributiva. “Precisamos de um sistema que alivie o peso sobre o consumo e transfira parte dessa carga para a renda dos mais ricos. Isso pode ser uma solução para reequilibrar o poder de compra da classe média e possibilitar sua recuperação”, sugere.
O que esperar do futuro?
Apesar do cenário preocupante, Charone acredita que ainda há esperança para a classe média, desde que haja uma mudança significativa na forma como o governo e a sociedade enxergam esse grupo. “Precisamos de políticas públicas que incentivem o crescimento econômico e gerem empregos de qualidade, com salários condizentes com o custo de vida. Além disso, é necessário educar financeiramente essa população para que ela saiba como administrar melhor seus recursos, evitando o endividamento excessivo”, conclui.
Ele reforça que seu livro “A Verdade sobre o Dinheiro” nasceu justamente dessa necessidade de dar ferramentas práticas para a classe média entender e gerenciar suas finanças de maneira mais eficaz. “As pessoas precisam de educação financeira para enfrentar esse novo mundo econômico. Sem isso, o ciclo de empobrecimento tende a continuar”, finaliza.
O que está acontecendo com a classe média?
O que está acontecendo com a classe média é um reflexo direto das políticas econômicas e da falta de planejamento a longo prazo. Se essa situação não for tratada de forma séria, o país corre o risco de ver um aumento significativo da desigualdade social, onde a tão sonhada ascensão social se tornará uma lembrança distante. Para André Charone, a resposta está na educação financeira e em reformas que promovam uma justiça fiscal real, abrindo caminhos para que a classe média volte a crescer e prosperar.
André Charone é contador e professor universitário
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.