Em fevereiro o ex-governador Sérgio Cabral rompeu sua rotina em Bangu 8, no Complexo Penitenciário de Gericinó, na Zona Oeste do Rio. Escoltado, percorreu 42 quilômetros até o Centro para chegar ao MPF (Ministério Público Federal), onde, pela primeira vez, confessou o recebimento de propinas. Desde então, ele já se apresentou quatro vezes diante do juiz Marcelo Bretas para esmiuçar o esquema de corrupção em seu governo. Nessas audiências, o ex-governador do Rio disse estar à disposição para revelar situações comprometedoras envolvendo políticos e empresários. As informações são do jornal O Globo.
Desde que assumiu a nova postura de defesa, ele também foi ouvido ao menos três vezes pelo Ministério Público do Estado. Cabral já falou sobre o ex-procurador-geral de Justiça Cláudio Lopes. Confirmou que ele recebeu propina enquanto comandava o MP estadual do Rio para blindar a organização criminosa do MDB.
O ex-governador depôs também sobre o prefeito de Niterói, Rodrigo Neves (PDT), que chegou a ser preso durante o mandato, acusado de corrupção. Ainda prestou esclarecimentos sobre a FGV Consultoria, que havia sido citada por ele em um depoimento a Bretas. Lopes, Neves e a FGV Consultoria negam irregularidades em suas condutas.
Somente no último depoimento a Bretas, em 23 de maio, Cabral citou sete vezes que estava à disposição do MP para esclarecer fatos que não faziam parte do processo em questão. Naquela oitiva, seu alvo principal foi o empresário Georges Sadala, ex-amigo que abocanhou contratos vultosos com o governo do Estado na gestão do emedebista com o programa Poupa Tempo. O ex-governador afirmou que poderia falar mais sobre um político de outro Estado que o apresentou a Sadala. Embora não tenha citado nominalmente, Cabral referia-se ao deputado Aécio Neves (PSDB).
Cabral se ofereceu ainda para falar sobre a melhoria de vida de Sadala, que se mudou de um condomínio da Barra da Tijuca para a Avenida Vieira Souto, em Ipanema. O emedebista disse que a prosperidade repentina não se deu por um benefício de Sadala “aqui no Rio de Janeiro”, mas em outro Estado. E, mais uma vez, prometeu contar o que sabe se fosse convocado pelo MP.
Ele também se ofereceu para falar sobre outros negócios envolvendo o ex-amigo e sobre o que viu e ouviu quando visitou o Poupa Tempo em São Paulo, onde foi conhecer a iniciativa antes de implementá-la no Rio. Sadala nega as acusações de que pagou propina a Cabral e de irregularidades em seus negócios.
Em outro depoimento, no dia 26 de março, o ex-governador se ofereceu para falar sobre Walter Faria, dono do Grupo Petrópolis:
“O Walter é uma pessoa de muita influência. Se o MP desejar, eu poderia esclarecer, em outras circunstâncias, muita coisa em relação a isso.”
Cabral tentou um acordo de delação premiada, que não vingou. Sua postura de admitir os crimes tem por objetivo diminuir os anos na cadeia. Embora colocar-se à disposição para falar sobre fatos alheios aos processos não traga uma redução de pena em si, é uma estratégia para dar credibilidade às confissões e demonstrar que quer colaborar com a Justiça.