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O impacto da morte do “Capitão Adriano” no caso Marielle Franco divide o Superior Tribunal de Justiça

Ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega foi morto durante operação da polícia baiana em fevereiro. (Foto: Polícia Civil/Divulgação)

Ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ouvidos reservadamente pelo Estado/Broadcast se dividem sobre o impacto da morte do ex-policial militar Adriano Magalhães da Nóbrega – apontado como chefe da milícia Escritório do Crime – no julgamento sobre a federalização das investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista, Anderson Gomes.

A decisão sobre a federalização ou não do caso caberá à Terceira Seção do STJ, em data ainda a ser marcada. A expectativa de integrantes do tribunal é que a análise ocorra depois do carnaval, mas um ministro afirma que as circunstâncias da morte do “capitão Adriano” (como Nóbrega era conhecido) ainda são nebulosas, o que recomendaria aguardar mais um pouco.

Em março, a Terceira Seção faz três sessões – nos dias 11, 25 e 31. O colegiado é formado pelos ministros que integram as duas turmas do tribunal especializadas em matérias criminais (a Quinta e a Sexta Turma), totalizando 10 magistrados.

Integrantes do STJ avaliam que se o julgamento for agora, “ninguém vai estar seguro para votar” diante dos desdobramentos da morte de Nóbrega, que faleceu após troca de tiros com a polícia, na Bahia. O Escritório do Crime é investigado por organizar esquemas de grilagem na zona norte do Rio e por ligação com o assassinato da vereadora Marielle. Para um membro do STJ, mesmo que a morte de Nóbrega não tenha nada a ver com o assassinato da vereadora, é preciso saber o que se passou.

Antes da morte do miliciano, a tendência do tribunal era não retirar das autoridades do Rio as investigações do assassinato de Marielle. Conforme revelou o Estado, um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) se posicionou contra a federalização do caso, endossando a opinião do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. Segundo o Estado apurou, a AGU e Moro mantêm a posição contrária à retirada das investigações do Rio.

A discussão, no entanto, ganhou um novo capítulo com a morte de Nóbrega.  Dois ministros do STJ ouvidos pela reportagem avaliam que não há dúvidas de que a morte do miliciano traz efeitos sobre a discussão do caso Marielle e pode influenciar o resultado final.

Outros três ministros, no entanto, discordam dos colegas. Um deles aponta que o STJ não entra no mérito das investigações, e só analisa se há demora injustificável que deva levar a apuração para Brasília. Outro magistrado diz que é difícil de acreditar que a polícia da Bahia, um Estado governado pelo PT, participaria da queima de arquivo de uma pessoa que eventualmente poderia prejudicar o grupo político “do outro lado”.

Foragido há 14 meses, Nóbrega também foi citado em apuração sobre o suposto esquema de “rachadinha” no gabinete que o senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ) mantinha na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

Segundo relatório do Ministério Público, ele ficava com parte do salário que sua mãe e sua mulher recebiam por trabalhar no escritório do filho do presidente Jair Bolsonaro – Flávio, na época, era deputado estadual. As duas teriam sido contratadas pelo ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz, investigado por lavagem de dinheiro e amigo de Nóbrega.

Parecer

Em documento revelado pelo Estado no mês passado, o Ministério da Justiça defende prestigiar a posição dos familiares de Marielle, que são contrários à federalização das investigações do assassinato da vereadora. A pasta de Moro subsidia o parecer da AGU, que reforçou a manifestação do ministro e também se colocou contra retirar a apuração das mãos das autoridades do Rio.

“Como bem ressaltado pelo Ministério da Justiça (..), os próprios familiares da ex-vereadora posicionaram-se desfavoravelmente à federalização das investigações e persecução penal, fator que, acreditamos, deve ser considerado e prestigiado pelo STJ”, destaca a AGU.

“Ademais, não se pode perder de vista que eventual deslocamento de competência à revelia da vontade de familiares das vítimas pode sinalizar futuro questionamento da conduta da União, sob eventual alegação (ainda que infundada) de que pode repercutir negativamente sobre as atividades investigativas e punitivas do Estado do RJ, no caso”, afirma o parecer.

Ministros do STJ, no entanto, alegam que a discussão é técnica e jurídica, minimizando a influência do posicionamento da família sobre a controvérsia.

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