Quinta-feira, 16 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 26 de janeiro de 2020
O juiz Marcelo Bretas, responsável pela Lava-Jato no Rio de Janeiro, decidiu recorrer a dois delatores para tentar solucionar a polêmica sobre a avaliação das joias apreendidas na casa do ex-governador Sérgio Cabral (MDB), em novembro de 2016.
Bretas solicitou que Roberto Stern e Antônio Bernardo avaliem as 40 peças que serão leiloadas pela Justiça Federal.
Os dois firmaram colaboração premiada após as investigações identificarem que suas respectivas joalherias, H. Stern e Antônio Bernardo, venderam peças sem nota fiscal para Cabral, que as usava para presentear a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo.
O leilão estava previsto para ocorrer em 15 de agosto do ano passado. O juiz, contudo, cancelou o certame após a Folha revelar que o preço mínimo atribuído às joias pela Caixa Econômica era 78% menor do que o atribuído a elas pela Polícia Federal.
A PF estimou o valor das 40 unidades em R$ 2,07 milhões, com base em notas fiscais entregues por joalherias e pesquisa de mercado. A Caixa as atribuiu a soma de R$ 455 mil.
O juiz determinou uma nova avaliação por um joalheiro especializado. Contratado para a missão, José Lopes de Alencar Júnior indicou um preço ainda menor para o lote: R$ 398 mil. Ele fez o cálculo com base no peso das pedras preciosas das joias — safira, esmeralda, tanzanita, rubi, entre outras. Ele não considera o design ou a marca da peça.
Prevendo a contrariedade do magistrado, o leiloeiro Renato Guedes sugeriu uma média entre as três avaliações (PF, Caixa e Alencar Júnior) e de uma pesquisa de mercado feita por sua equipe na internet. O cálculo baixou para 60% o desconto a ser dado no preço mínimo do leilão.
O Ministério Público Federal sugeriu, então, que Roberto Stern avaliasse as joias que vieram de suas lojas. Bretas acatou a sugestão e determinou que Antônio Bernardo também analisasse aquelas vendidas por sua empresa.
Dados da Polícia Federal mostram que, do lote de 40 peças, apenas um relógio e um par de brincos foram fabricado pela H. Stern, e 18 joias, pela Antônio Bernardo. Outras 20 são de diferentes fabricantes.
Stern já esteve na Caixa em novembro, mas sua avaliação ainda não foi divulgada. Já Bernardo deve ir ao banco até o fim do mês.
O valor de venda das joias e relógios vai depender dos interessados, que darão lances sucessivos para se obter o maior valor possível.
Ironicamente, pode estar nas mãos dos interessados no leilão a efetividade da tese de defesa de Cabral sobre o tema.
As joias foram apontadas como uma das formas do casal lavar o dinheiro obtido com propinas. Interrogado sobre o tema, Cabral negou o crime.
“Não se lava dinheiro comprando joias. […] Vossa Excelência sabe que, quando são compradas e saem da loja, já saem sem o valor da vitrine”, disse Cabral.
Foi neste interrogatório, inclusive, que o ex-governador discutiu com Bretas ao mencionar o fato de a família do juiz ser dona de loja de bijuteria.
Essa fala, que indicou para o juiz o recebimento de informações consideradas indevidas a um preso, motivou sua transferência para Curitiba, posteriormente revogada.
Cabral foi condenado a 13 anos e quatro meses de prisão na ação que trata da lavagem de dinheiro por meio das joias — ele já soma quase 268 anos de prisão. Adriana Ancelmo, a dez anos e oito meses.
Desde o ano passado, Cabral decidiu confessar crimes como a cobrança de propinas. Também firmou acordo de colaboração com a PF, que está sob análise do STF (Supremo Tribunal Federal).
O ex-governador ainda não abordou a acusação de lavagem de dinheiro por meio de joias nos interrogatórios com a nova postura. Há um recurso contra essa condenação no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2).
Além das 40 peças sob avaliação, há outras 97 joias apreendidas também no apartamento do casal em dezembro de 2016, quando Adriana foi presa. Este conjunto valia R$ 2,9 milhões, segundo a PF — incluindo a peça mais cara arrecadada: um par de brincos em formato de flores com 24 diamantes cada um, avaliado em R$ 240 mil.
O Ministério Público Federal não incluiu esse lote no pedido feito à Justiça — o que deve ocorrer futuramente.