O mercado elevou sua previsão para a inflação do ano que vem de 4,12% para 4,34%, segundo a mais recente edição do Boletim Focus, divulgado pelo Banco Central (BC). Foi uma pancada e tanto em um curtíssimo espaço de tempo, ainda mais quando se considera que o BC não divulga a média, mas a mediana das expectativas, uma medida que reduz a chance de distorções que poderiam ser ocasionadas por poucas projeções muito altas ou muito baixas.
Foi a sexta semana consecutiva de piora em expectativas para o IPCA de 2025, e o mercado já projeta que a inflação ficará acima do teto da meta, de 4,5%, ao longo de todo o primeiro semestre do ano que vem. Dólar em elevação, alimentos mais caros, consumo das famílias em alta e desemprego em nível historicamente baixo têm feito muitos bancos e corretoras ajustarem suas expectativas a uma conjuntura mais desafiadora nos próximos meses.
Também no Boletim Focus, a previsão para a inflação para 2026 passou de 3,70% para 3,78%, e a de 2027, de 3,50% para 3,51%, após 72 semanas seguidas sem registrar qualquer variação. O dólar para o fim de 2024 passou de R$ 5,60 para R$ 5,70 e, com isso, a expectativa para o IGP-M, índice usado como referência para o reajuste de aluguéis e que sofre mais influência do câmbio, subiu de 5,45% para 5,98% para o fim deste ano.
O reconhecimento desse cenário mais adverso já não é mais exclusividade do mercado. Na semana passada, o Ministério da Fazenda elevou sua estimativa para a inflação deste ano de 4,25% para 4,4%, e, para a de 2025, de 3,4% para 3,6%. As previsões da Fazenda são mais modestas que as calculadas por analistas de bancos e corretoras, mas avançam na mesma direção.
O governo, por óbvio, preferiu destacar suas projeções para o crescimento do PIB, de 3,3% neste ano e de 2,5% em 2025, melhores que as do mercado, de 3,17% e 1,95%, respectivamente. Mas o que realmente tem chamado a atenção são a rapidez e a intensidade com que as expectativas têm piorado, um cenário que as deixa cada vez mais próximas de se tornarem um fato consumado, alertou o economista José Roberto Mendonça de Barros.
Em recente entrevista ao Estadão, Mendonça de Barros ressaltou que a inflação voltou a entrar no radar dos investidores. “O que mais preocupa é que a inflação encostou em 5%. Não é que ela encostou no teto da meta; ela encostou em 5%”, afirmou. “É muito mais perigoso o negócio da inflação do que parece”, acrescentou.
Tudo isso torna ainda mais incompreensível a demora do governo Lula da Silva em anunciar de uma vez o ajuste fiscal, única maneira de interromper a piora das expectativas. O mercado está preocupado com o cenário, mas tem como se proteger.
Já o Executivo não parece compreender a gravidade da situação, age como se estivesse imune a esses riscos e ignora que os preços mais elevados em breve chegarão aos preços dos itens nas gôndolas dos supermercados. Negar essa realidade não fará com que ela desapareça e, como lembrou Mendonça de Barros, uma inflação elevada derruba a avaliação de qualquer governo. (Opinião/Jornal O Estado de S. Paulo)