Sexta-feira, 29 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 29 de abril de 2018
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Ao subir uma trilha nos Pirineus em busca de um lugar onde pudesse praticar o arco e flecha, deparei-me com um pequeno acampamento do Exército francês. Os soldados me olharam, eu fingi que não estava vendo nada (todos nós temos um pouco esta paranoia de sermos considerados espiões…) e segui adiante.
Achei o lugar ideal, fiz os exercícios preparatórios de respiração, e eis que vejo um veículo blindado se aproximando.
Na mesma hora me coloquei na defensiva, e preparei todas as possíveis respostas para as perguntas que me seriam feitas: tenho permissão de usar o arco, o local é seguro, qualquer palavra em contrário cabe aos guardas florestais e não ao exército, etc… Mas eis que salta do veículo um coronel, pergunta se eu sou o escritor, relata alguns fatos interessantíssimos sobre a região.
Até que, vencendo a timidez quase visível, diz que também escreveu um livro: e me conta a curiosa gênese de seu trabalho.
Ele e sua mulher faziam doações para uma criança leprosa que originalmente vivia na Índia, mas que depois foi transferida para a França. Um belo dia, curiosos de conhecer a menina, foram até o convento onde freiras se encarregavam de tomar conta. Foi uma tarde linda, e no final uma freira pediu que ele ajudasse na educação espiritual do grupo de crianças que ali vivia. Jean Paul Sétau (este é o nome do militar) disse que não tinha qualquer experiência em aulas de catecismo, mas que iria meditar, e perguntar a Deus o que fazer.
Naquela noite, depois de suas orações, escutou a resposta: “ao invés de dar respostas, procure saber o que as crianças querem perguntar”.
A partir daí, Sétau teve a ideia de visitar várias escolas, e pedir que os alunos escrevessem tudo que gostariam de saber a respeito da vida. Pediu que as perguntas fossem feitas por escrito, evitando desta maneira que os mais tímidos tivessem medo de se manifestar. O resultado do seu trabalho foi reunido em um livro – “A criança que quer saber tudo” (Ed. Altess, Paris).
A seguir, algumas das perguntas:
Aonde vamos depois da morte?
Por que nós temos medo de estrangeiros?
Existem marcianos e extraterrestres?
Por que acontecem acidentes mesmo com gente que acredita em Deus?
O que significa Deus?
Por que nascemos, se morremos no final?
Quantas estrelas têm no céu?
Quem inventou a guerra e a felicidade?
O Senhor também escuta aqueles que não acreditam no mesmo Deus (católico)?
Por que existem pobres e doentes?
Por que Deus criou mosquitos e moscas?
Por que o anjo da guarda não está perto quando estamos tristes?
Por que amamos certas pessoas, e detestamos outras?
Quem deu nome às cores?
Se Deus está no céu, e minha mãe também está lá porque morreu, como é que Ele pode estar vivo?
Oxalá alguns professores ou pais, lendo esta coluna sintam-se estimulados a fazer a mesma coisa. Desta maneira, ao invés de tentar impor nossa compreensão adulta do universo, terminaremos por relembrar algumas de nossas perguntas da infância – que na verdade jamais foram respondidas.
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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