O poder do Congresso sobre o Orçamento federal foi turbinado na última década. O volume de emendas parlamentares pagas pelo governo Lula em 2023 chegou a R$ 34,5 bilhões.
A cifra representa 17,9% das chamadas despesas livres, a parcela dos recursos públicos que o Executivo teria para escolher em que gastar, mas, neste caso, quem dá a ordem é o Legislativo. Comparado com 2014, o valor pago às emendas atualmente é 179 vezes maior.
Naquele ano, as emendas pagas correspondiam a 0,1% (R$ 200 milhões). Não por acaso, ao longo da última década, o Congresso aprovou uma série de alterações constitucionais que, por um lado, conferiram aos parlamentares maior controle e influência sobre o Orçamento, culminando na aprovação recorde de R$ 53 bilhões em recursos em 2024; e, por outro, enfraqueceram um dos principais instrumentos de negociação do Executivo: a discricionariedade orçamentária, ou seja, o poder de decidir o destino os recursos públicos.
Atualmente, 93% do Orçamento do País está comprometido com gastos obrigatórios (aposentadorias, salários, etc), restando uma margem de 7% para as despesas discricionárias destinadas a investimentos em obras, por exemplo. São gastos ‘livres’, cuja aplicação pode ser decidida pelo governo com base em critérios econômicos.
É sobre esta fatia menor que há a disputa entre Executivo e Legislativo para decidir quem vai determinar a destinação das verbas federais. As emendas parlamentares são o instrumento legal utilizado por deputados e senadores para direcionar recursos às suas bases eleitorais.
Levantamento realizado pelo economista e pesquisador do Insper Marcos Mendes considerou as emendas que foram efetivamente pagas, incluindo também os valores dos restos a pagar – montante referente às emendas que iniciaram o processo de execução, mas não foram pagas no mesmo ano, sendo transferidas para o orçamento subsequente.
Para Mendes, o aumento do controle orçamentário pelo Congresso gera um conflito de competências entre os entes federativos, à medida que recursos federais, originalmente destinados ao Executivo e aos seus ministérios, passaram a ser remanejados por meio de emendas parlamentares para a realização de investimentos que, teoricamente, deveriam ser de responsabilidade dos municípios.
“O dinheiro federal é para cuidar da Força Nacional de Segurança, desenvolver políticas de imunização de saúde, investir em rodovias federais… As emendas tiram dinheiro que seria para essas finalidades e mandam para o município para asfaltar rua, por exemplo, uma coisa que deveria ser feita pelo município com o dinheiro municipal. Os municípios brasileiros já recebem muitas transferências, porque têm uma base tributária grande”, explica.
Mendes considera que o crescimento do poder do Congresso para definir o destino dos recursos públicos leva não só à fragmentação orçamentária, como também conduz a políticas públicas ineficientes, desordenadas e de baixa qualidade, por privilegiar muitas vezes os interesses eleitorais e locais dos parlamentares em detrimento de critérios objetivos e das prioridades estratégicas estabelecidas em nível nacional pelo Executivo.
“Aquele argumento de que os parlamentares conhecem as necessidades imediatas da população de suas cidades… Pois bem, então que levem a realidade do município para se encaixar nas políticas federais. Não cabe ao parlamentar fazer e desenhar a política pública”, explica.