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Por Redação O Sul | 4 de fevereiro de 2019
O projeto de lei contra corrupção e anticrime apresentado nesta segunda-feira (4) pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, dividiu a opinião de especialistas em segurança pública. Ao mesmo tempo em que houve quem considerasse positivas as medidas apresentadas pelo ex-juiz, as propostas também causaram estranheza por não terem sido debatidas com profissionais de segurança, sociedade e outras organizações ligadas ao setor. As informações são do jornal O Globo.
Guilherme France, pesquisador do Centro de Justiça e Sociedade da FGV, avaliou como positivas as medidas legislativas propostas por Moro para o combate à corrupção. France também destacou iniciativas que propõem a criação de um banco nacional de DNA, o que, na sua avaliação, podem contribuir para aumentar a taxa de elucidação de crimes de homicídio, que historicamente é muito baixa. “A alteração legislativa que propõe a criminalização do Caixa 2 é relevante. Outra coisa é são as medidas que ajudam a aprimorar investigações, já que há muita dificuldade hoje no esclarecimento de casos de homicídio”, afirmou o pesquisador.
Por outro lado, o pesquisador demonstrou preocupação com relação às propostas do ministro que endurecem o Código Penal. Para o estudioso, medidas que aumentam penas e dificultam a progressão de regime podem agravar o quadro de superlotação do sistema carcerário.
“A experiência brasileira mostra que o aumento do número de pessoas condenadas e presas não resulta em melhora da segurança e na redução da violência. O Brasil já se encontra em situação de super encarceramento e a gente não tem visto melhora na segurança”, afirma France, que também tem restrições com relação à proposta do “plea bargain”:
“É uma prática criticada e questionada nos EUA. O temor é de que uma pessoa que não necessariamente tem uma assessoria jurídica acabe sendo pressionada e aceite um acordo – mesmo não sendo culpada – pelo temor de uma pena maior”, conclui.
Para Arthur Trindade, professor da UnB e ex-secretário de segurança do Distrito Federal, o pacote se concentrou no combate à corrupção e “decepcionou” quem esperava propostas para o combate ao crime organizado e à criminalidade urbana. “O nome correto seria um pacote anti-corrupção, não pacote anti-crime contra a violência”, avalia Trindade.
Na avaliação do especialista, o ministro terá que apresentar ainda medidas para as outras áreas além da segurança: “Todos sabemos que ele não vai se resolver problema de segurança pública no Brasil só com lei.”
Trindade acredita que o governo precisa avançar em proposta para a integração das polícias, por exemplo. “Ele não trata dos problemas estruturais de segurança pública, da desarticulação das polícias, da divisão de tarefas entre união estados e municípios. Ele não trata da organização de carreira (dos profissionais de segurança pública).”
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a proposta de Moro ainda depende de uma análise mais aprofundada, sobretudo porque sugere a alteração de vários pontos do Código de Processo Penal, com foco no combate à corrupção, endurecimento de penas e aumento do encarceramento. “Combater a lavagem de dinheiro é necessário, mas insuficiente para frear a escalada do crime organizado e, principalmente, da criminalidade violenta”, diz trecho da nota divulgada pela entidade.
“Causa, ainda, estranhamento que o projeto tenha sido elaborado sem consulta aos profissionais de segurança, à sociedade civil organizada e ao Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social e do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, entre outros órgãos”, continua.
O advogado Yuri Sahione, que é presidente da Comissão de Compliance da OAB-Rio, pondera que o projeto não indica melhora imediata na segurança pública, embora acredite que no médio prazo os presos perigosos devem ficar detidos por mais tempo.
“Essas medidas vão tentar diminuir o poder e a estabilidade dos grupos criminosos. Mas se o estado não ocupar o território e não se fizer presente com a polícia em patrulhamento ostensivo, pode até aplicar pena de morte que não vai resolver”, diz Sahione. “Eu não avalio positivamente apenas aumento de pena e recrudescimento de regimes, já que o crime não deixa de ser praticado tão somente pelo receio da gravidade da sanção.”
Alvo de críticas de defensores de direitos humanos, a possibilidade do “Plea Bargain” foi recebida com otimismo pelo jurista. A medida permite que seja feita acordo entre o acusado e o Ministério Público em troca de benefícios como a redução de pena, sem a necessidade de julgamento.
Para Sahione, a medida mais importante é a criação da figura do “informante do bem”, que abre a possibilidade de premiar denunciantes de esquema de corrupção com o equivalente a 5% do dinheiro recuperado pelas autoridades.