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Por Redação O Sul | 22 de novembro de 2016
Dois fósseis brasileiros com cerca de 230 milhões de anos, que acabam de ser apresentados oficialmente à comunidade científica, ajudam a entender como os dinossauros surgiram e se diversificaram. Em uma palavra: devagarzinho.
É o que se depreende da convivência entre um dos mais antigos dinos conhecidos, o predador Buriolestes schultzi, de apenas 1,5 metro de comprimento, e um carnívoro ainda menor, o Ixalerpeton polesinensis (que media 0,5 metro).
À primeira vista, eles são muito parecidos – um tem cara de ser a miniatura do outro, praticamente –, mas o bicho menor não era bem um dinossauro. Pertencia, na verdade, a um outro grupo de répteis bípedes, os lagerpetídeos, derivado do mesmo tronco que também deu origem aos dinos.
“Você vê um momento de experimentação com várias formas diferentes de animais, muitas das quais acabam se extinguindo. É um ‘miolo’ muito complicado”, diz o paleontólogo Max Cardoso Langer.
Os fósseis vêm da pequena São João do Polêsine, cidade com menos de 3 mil habitantes fundada por imigrantes italianos no interior gaúcho, e datam do período Triássico. Os esqueletos estão bastante completos, o que é uma novidade importante – até hoje, dinos primitivos só tinham sido encontrados lado a lado de seus primos próximos em estado bastante fragmentado.
Além disso, se a análise proposta pelos cientistas brasileiros estiver correta, o B. schultzi é o mais primitivo dos sauropodomorfos – o grupo que, mais tarde, dará origem aos imensos quadrúpedes pescoçudos e herbívoros conhecidos popularmente como brontossauros. A ironia é que a linhagem desses animais parece ter começado com uma criatura que se alimentava de carne, e não de plantas.
Alguns detalhes cruciais denunciam a diferença entre o dinossauro propriamente dito e o lagerpetídeo. Um deles é o chamado osso pós-frontal, que fica na órbita ocular do crânio do I. polesinensis. “Trata-se de um osso que nunca está presente em dinossauros”, conta Langer.
Além disso, embora ambos os bichos fossem bípedes, os ossos da pelve do lagerpetídeo sugerem que ele não tinha uma postura tão ereta quanto a do dino seu contemporâneo.
Como seria de esperar, os dentes do B. schultzi ajudaram os cientistas a estimar qual era sua dieta. Eles possuem formato recurvado, pontiagudo e achatado lateralmente, além de apresentar dentículos (serrilhas na superfície dentária) pequenos, todos exemplos de adaptação para devorar carne.
Evolução.
Segundo Langer, a complicada situação evolutiva dos primeiros dinossauros e de seus primos “não dinossaurianos” fica menos esquisita se for comparada com a dos primórdios da evolução humana.
Quando se esquece por um momento o destino de ambos os grupos, fica claro que nunca houve uma sequência do tipo “escadinha evolutiva” levando aos tiranossauros ou ao homem moderno, mas sim algo como arbustos genealógicos, ou seja, inúmeros grupos evoluindo mais ou menos ao mesmo tempo e experimentando estratégias ligeiramente diferentes de sobrevivência.
Essa situação embolada só muda com o fim do período Triássico, há 200 milhões de anos, quando os dinos propriamente ditos deslancham de vez como o mais importante grupo de vertebrados terrestres, enquanto muitos de seus parentes somem durante um evento de extinção em massa (talvez ligado a grandes erupções vulcânicas).
Não está claro o porquê de os dinos terem escapado dessa hecatombe para reinar no Jurássico. Langer cita algumas possibilidades: a sua postura bípede e ereta, que lhes conferia especial agilidade; a presença de estruturas semelhantes a penas rudimentares, ajudando-os a conservar melhor o calor do corpo; e a eficiência respiratória, teoricamente similar à das aves modernas, ideal para extrair o máximo possível de oxigênio da atmosfera.
Seja como for, é inegável que as extinções em massa foram cruciais para moldar os padrões da evolução dos dinos. Eles surgem depois da maior de todas elas, a do Permiano, tornam-se dominantes após a do Triássico e são esmagados pela grande extinção do Cretáceo, há 65 milhões de anos, após a qual apenas os dinossauros avianos sobrevivem, analisa Langer. (Folhapress)