Há dias em que a vida parece consistir em navegar nos menus dos aplicativos. Às vezes são menus dentro de menus, como quando você escaneia um QR Code num restaurante e luta com uma interface estranhamente complexa para pedir um burrito. Bons menus são portais úteis. Menus ruins são obstáculos irritantes.
A empresa japonesa Atlus fabrica videogames que oferecem uma terceira abordagem: menu com status de evento principal. Ao abrir um de seus menus, as opções se desenrolam num banquete sensorial de cor, movimento, som e tipografia. Em seu RPG “Metaphor: ReFantazio”, um elaborado conto de intriga política, as letras do menu principal se encaixam como uma coroa na imagem da cabeça do protagonista.
Fora da bolha
O principal designer de interface de “Metaphor”, Koji Ise, nunca tinha trabalhado num game e não buscou inspiração no meio.
“Assisti a videoclipes, fui a exposições de arte, estudei pinturas medievais”, diz Ise, que já trabalhou em sites, aplicativos e anúncios. “Este jogo tem uma vibração muito medieval, então olhei para Leonardo da Vinci e pensei em como ele criaria menus. Fiz questão de incluir seu estilo de pincelada.”
Os jogos de RPG japoneses produzidos pela Atlus, incluindo a série Persona, fazem parte de um gênero rico em narrativas, conhecido por cenários extremamente imaginativos e personagens complexos. Mas manifestar essas narrativas normalmente requer muitos cálculos numéricos. Jogar pode ser semelhante a trabalhar numa planilha.
“Um RPG é um jogo de menu”, diz Winnie Song, professora de design de jogos no Game Center da Universidade de Nova York. “Isso é tudo que você está fazendo. Antes de uma batalha, você pensa: ‘Quais personagens estou escolhendo? Com o que eles estão equipados?’.”
A principal ideia da Atlus é que, se o jogo for jogado principalmente nos menus, então os menus merecem o maior investimento estético. Essa é uma abordagem que diverge radicalmente da filosofia dominante, inspirada na Apple – minimalista, organizada e utilitária, quase imperceptível.
A Atlus projetou seus menus reconhecendo que minimalismo e clareza não são necessariamente sinônimos. Se bem feita, uma interface de usuário barroca pode apontar tão claramente a direção certa quanto uma interface austera.
Masayoshi Suto, que foi o principal designer de UI de muitos jogos da Atlus e atuou como consultor de design da Metaphor, disse que originalmente pensava na interface do usuário como um simples layout de informações. Mas certa vez ocorreu-lhe que uma interface de usuário mais expressiva poderia tornar essa informação divertida.
Sex Pistols
Os menus exuberantes do jogo “Persona 5”, diz Suto, inspiraram-se tipograficamente nas capas em estilo de “nota de resgate” dos álbuns do Sex Pistols.
Shigenori Soejima, principal designer de personagens da Atlus, lembrou que, como o jogo incluía um sujeito que fazia comentários durante cenas de batalha, a Atlus também olhou para os gráficos ricos em dados, mas muitas vezes bombásticos, de partidas esportivas televisionadas.
Katsura Hashino, diretor de “Metaphor” e “Persona”, percebeu que a ênfase da Atlus no estilo do menu começou a influenciar os jogos de maneiras inesperadas; e até a música acabou sendo guiada pela UI. Cada quadro de “ReFantazio” pretende deslumbrar, mas nada o faz mais do que os menus.