A recente discussão acerca do Projeto de Lei 293/2024, que propõe a proibição de celulares nas escolas estaduais de São Paulo, reacendeu, não só na sociedade, mas nos indivíduos que, como eu, são mães, pais e educadores, um debate fundamental sobre o papel da tecnologia na educação. Estamos há alguns bons anos tentando dia após dia tornar nossas escolas e nossas vidas mais tecnológicas. A sensação de que estamos atrasados em relação às novidades é sempre uma companheira.
E, diante deste cenário, pessoas como eu, que sempre se posicionaram a favor de uma escola atenta às necessidades do nosso momento histórico e familiarizada com a tecnologia, se apresentam também a favor de um projeto que pretende excluir os celulares das escolas e atrasar o acesso de crianças e adolescentes ao mundo das redes sociais. Existe contradição aqui?
Primeiro, é preciso entender o que é uma tecnologia aliada à aprendizagem. Quando tiramos os celulares dos estudantes, eles voltam a brincar, se relacionar, surgem outros tipos de alegrias e tristezas, conflitos são mais diversificados e precisam ser resolvidos presencialmente. Crianças e adolescentes se movimentam mais e, fisicamente, podem se machucar mais. Toda essa descrição não parece falar sobre tecnologia, certo? Mas é aí que está a estratégia de integração tecnológica que melhora a aprendizagem: quando as ferramentas tecnológicas estão integradas à realidade escolar de maneira holística, elas transformam o espaço educacional em um meio para aprender, não um fim em si mesmo.
Nessa escola, a tecnologia permeia o ambiente não apenas através de dispositivos digitais, mas por meio de uma construção física e pedagógica que inclui, se adequa e transforma a experiência dos estudantes.
Desde um mobiliário adaptável, capaz de ser reconfigurado para diferentes layouts e que atende às necessidades específicas de cada contexto de aprendizado, até a curadoria de recursos educacionais, toda escolha tecnológica precisa estar alinhada aos objetivos de aprendizagem. Garantir que a escola conte com ferramentas e aparatos flexíveis permite que o ambiente escolar acompanhe a dinâmica das atividades pedagógicas, promovendo tanto a colaboração quanto a individualização dos processos de aprendizagem.
Além disso, os espaços dedicados ao lazer e à brincadeira são vitais. Quando tiramos os celulares dos estudantes, foram diferentes ondas de emoções: primeiro a revolta, depois a aceitação gradual. Neste processo, algo foi ficando claro: tirar os celulares dos estudantes não diminui a carga de tecnologia de uma escola, mas sim aumenta a demanda por espaços inteligentes de convivência – mais quadras, com agenda de revezamento no uso; mais livros, com controle de disponibilidade; mais espaços de descontração, com atividades diversificadas.
A proibição dos celulares, portanto, não deve ser vista como uma restrição do contato com a tecnologia, mas como um convite para que os alunos se reconectem com o espaço físico da escola e com as pessoas ao seu redor, mediados por usos éticos e estratégicos dos recursos existentes nesse espaço.
Cultivar oportunidades para que o estudante possa ser parte deste todo e cultivar as melhores relações humanas de um jeito único e autoral é o que faz uma escola ser tecnológica. O resto é tralha e distração. A tecnologia nunca substituirá o calor humano, a curiosidade e a alegria que vem do aprendizado compartilhado. Estas são, sem dúvida, as maiores tecnologias que temos a oferecer. (Por Leticia Lyle)