Segunda-feira, 27 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 3 de novembro de 2019
Aliados do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), tentam evitar que o racha com a família Bolsonaro dê início a retaliações políticas e econômicas à sua gestão no Estado. Após o presidente Jair Bolsonaro acusar Witzel de vazar informações sigilosas para envolvê-lo nas investigações do caso Marielle, a relação entre os dois se deteriorou de vez e o troco é esperado no Palácio Guanabara.
Interlocutores medem a temperatura da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio), onde a fragilização da base do governador, que conta com deputados do PSL, pode abrir caminho até a uma CPI para apurar o suposto vazamento.
Na terça (29), Bolsonaro subiu o tom dos ataques a Witzel e disse que tinha ouvido do governador, no início do mês, que seu nome seria implicado no caso Marielle. Bolsonaro já havia alfinetado o governador em um discurso no último dia 11, em Itaguaí, quando pediu uma conduta “ética, moral e sem covardia” enquanto olhava para o ex-aliado.
Um deputado da base bolsonarista disse que uma CPI contra o governador começa a ser ventilada, embora ainda sem recolhimento de assinaturas. Parlamentares do PSL acreditam que a medida teria adesão entre deputados de outras legendas de oposição. Na quinta (31), em discurso no plenário da Alerj, o deputado Luiz Paulo (PSDB) defendeu uma “investigação profunda” sobre a conduta de Witzel e afirmou que um ato de improbidade “leva ao impeachment, se provado e demonstrado”.
Em meio à divisão que vive o PSL nacionalmente, não há determinação formal para que a bancada na Alerj, formada por 12 deputados, se volte contra Witzel. Mas tanto membros do PSL quanto da oposição admitem um clima pouco amistoso para o governador.
“O problema do Witzel é que ele está trabalhando com a Presidência na cabeça desde que assumiu o governo do Estado”, diz um deputado.
Recuperação fiscal
Witzel negou ter acesso a informações da investigação e também elevou o discurso, quando declarou que a recusa em estender o acordo de recuperação fiscal por “interferência” de Bolsonaro representaria “crime de responsabilidade”. Já o pastor Everaldo Pereira, presidente do PSC e articulador da campanha de Witzel à presidência, apelou à “sensatez” de Bolsonaro.
“O presidente Bolsonaro naturalmente está interessado no bem do Rio. Quando baixar a poeira, não vejo problema para a relação voltar ao normal”, disse Everaldo.
O acordo, assinado em 2017, prevê contrapartidas do estado com um efeito fiscal de R$ 85 bilhões. Na sexta, o Conselho de Supervisão Fiscal — formado por dois integrantes do governo federal e um do governo estadual — rejeitou uma proposta de Witzel para repactuar as exigências e diminuir para R$ 72 bilhões o impacto esperado por parte do Rio.
Witzel terá 30 dias para apresentar uma nova proposta, sob risco de perder a renovação do acordo até 2023. Procurado, o conselho não fechou as portas para uma repactuação e informou que o estado “deverá demonstrar medidas de ajuste suficiente para garantir o equilíbrio fiscal”.
“O ideal seria repactuar o acordo, porque as condições são muito severas. Mas o que vejo é Witzel ensaiar uma acusação política por antever que não conseguirá cumprir exigências técnicas”, afirmou o deputado federal Otoni de Paula (PSC-RJ). “Ao perseguir Bolsonaro, o próprio governador jogou no lixo qualquer chance de acordo político. Foi picado pela mosca azul e ficou cego.”
Dissidência no PSC
Otoni perdeu o cargo de vice-líder do PSC em Brasília após dizer que Witzel tratava Bolsonaro com “ingratidão”. O deputado mantém sua pré-candidatura a prefeito do Rio e procura o apoio de Bolsonaro, que ameaça deixar o PSL, partido com ao menos três nomes lançados à sucessão de Marcelo Crivella: o deputado federal Luiz Lima e os estaduais Rodrigo Amorim e Márcio Gualberto.
Amorim, nome escolhido inicialmente pelo senador Flávio Bolsonaro para concorrer à prefeitura, nunca teve apoio de Jair Bolsonaro devido à sua proximidade com Witzel. Após o presidente ordenar o desembarque do PSL do governo estadual, em setembro, Amorim foi um dos que não cortaram laços com o governador. À época, Flávio recuou no pedido e pediu apenas “independência” do partido em relação a Witzel.
Desde a eleição de Sérgio Cabral e a reeleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006, o alinhamento entre os governo estadual e federal se sustentou por mais de uma década no Rio, alcançando as gestões de Dilma Rousseff e Luiz Fernando Pezão — este último se relacionou também com Michel Temer.
Eleito com forte apelo ao bolsonarismo, Witzel procurou reforçar a harmonia no início do mandato. A crise com Bolsonaro, no entanto, pode reabrir uma nova era de governadores e presidentes que não falam a mesma língua.