Sábado, 11 de janeiro de 2025
Por Edson Bündchen | 28 de dezembro de 2023
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Mais uma volta da terra em torno do sol se completa e cá estamos a fazer os tradicionais balanços do ano que passou. A criação do calendário tem uma longa e interessante história, sendo um assunto que toca o coração das pessoas e, por isso mesmo, se encontra incrustado nas mais diversas culturas e sob as mais variadas interpretações. Hoje, o calendário gregoriano pode ser considerado de uso universal e até aqueles povos que, por motivos religiosos, culturais ou outros, continuam agarrados aos seus marcadores de tempo tradicionais, utilizam o calendário gregoriano nas suas relações internacionais. Assim, estamos todos sob o mesmo e implacável escrutínio do passar das horas, queiramos ou não, pouco importando se o relógio é regulado por grãos de areia ou partículas subatômicas.
Falando em calendário, 2023, se não merece o título de um “annus horribilis”, também não faz jus a qualquer tratamento mais efusivo. Da mesma forma como a atual sociedade fragmentou-se, com a emergência de novas tecnologias, assim também sucedem os eventos pelo mundo: fragmentados, polifônicos, inconstantes e muitos deles perigosos. Há, entretanto, apesar dessa ausência de homogeneidade, assuntos catalisadores da atenção planetária, muitos deles capazes de tirar o sono de alguns, porém sem despertar sequer a curiosidade da grande massa, que segue a sua marcha adormecida e indiferente, como de resto sempre foi. O mundo, de fato, continua sendo obra de poucos, para o bem e para o mal. Para os donos do mundo, o frenético passar dos segundos opera noutra dimensão, mais instável na superfície, mas solidamente ancorado nas placas tectônicas do domínio geopolítico e econômico que ostentam posições antes conquistadas. Que o digam os EUA, cujo PIB representa mais de um quarto da riqueza do planeta medida sob esse parâmetro. Quando considerado apenas o PIB dos países das 10 maiores economias do mundo, elas correspondem a dois terços de toda economia mundial, sendo que as 20 maiores economias correspondem a mais de 80% de toda produção planetária.
Numa perspectiva menos febril, nesse contexto de ultra concentração do poder global, os movimentos são vistos com um espectro de mais longo alcance, o que permite observar, por exemplo, o lento e gradual avanço da China, cujo PIB deve emparelhar com o americano já em 2050. Contudo, é bom lembrar que há quatro vezes mais bocas chinesas do que americanas para alimentar, denotando como é ainda potente, em termos relativos, a hegemonia do grande irmão do norte.
Se ainda é confortável o domínio econômico americano, não podemos falar o mesmo das tensões que rondam o ambiente político, tanto por lá quanto nos mais diversos lugares. Governos democráticos estão cada vez mais acossados por pendores autoritários, emergência de caudilhos, líderes populistas e outsiders de todo o tipo de calibre e que pairam sombriamente sobre as democracias tradicionais. O crescimento da xenofobia, uma profunda reacomodação geopolítica em curso, tendo a China na proa, a nunca indiferente Rússia, com o indefectível Putin montado no cavalo nuclear, não deixam dúvidas sobre o tamanho das transformações em curso. Além disso, novos focos de tensão, como a improvável e intempestiva questão de Essequibo, traz a disputa territorial para o nosso já inseguro continente latino-americano, como se não bastasse que o mesmo já responda por metade das mortes violentas no mundo, tendo apenas 8% da população do planeta. A guerra na Ucrânia e a continuidade do confronto entre Israel e os terroristas do Hamas denotam o insaciável apetite do Deus da guerra, alheio aos reclames de uma ONU cada vez mais impotente.
O ano de 2023, também tornou mais aguda a emergência climática. As amostras em tempo real das tragédias que a natureza trouxe, forçam as lideranças globais para um acordo de cooperação que nunca chega. Por fim, a Inteligência Artificial veio para ficar, despertando entusiasmo e apreensão quase que em igual medida, o que pode sinalizar que, como em todas as grandes mudanças, essa também traz embutida o sonho e o pesadelo. Feliz 2024!
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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