Os juros básicos do País caíram ao menor nível da história, mas esse patamar não está ao alcance do bolso dos brasileiros. Enquanto os bancos passaram a gozar de uma taxa de 6,75% na hora de captar seus recursos, para as pessoas físicas os juros do cartão de crédito, por exemplo, continuam acima dos 300% ao ano. Esse descompasso tem nome: spread, palavrão que significa a diferença entre a taxa de captação das instituições e o juro efetivamente cobrado dos clientes. Há mais de duas décadas o BC (Banco Central) anuncia esforços para tentar derrubá-lo, mas o spread continua emagrecendo mais lentamente que a taxa básica de juros (Selic). Para o consumidor, fica a sensação de que a queda da Selic é mais uma fake news.
Enquanto a Selic caiu a menos da metade de outubro de 2016 até agora, passando de 14,25% para 6,75% ao ano, o spread bancário para pessoas físicas encolheu em apenas um quarto: foi de 62,3 pontos percentuais para 46,1 pontos em dezembro, último dado disponível. Em 2016, segundo dados do Banco Mundial, o spread bancário brasileiro era o segundo maior do mundo, atrás apenas do de Madagascar.
Luis Miguel Santacreu, analista da Austin Rating, afirma que a redução da Selic ao seu novo piso histórico deixa evidente o problema do spread. Segundo ele, isso se explica, em parte, por uma estratégia de manutenção da rentabilidade pelos bancos, que é favorecida pela concentração do setor.
“Se os bancos repassarem toda a queda da Selic para as taxas que cobram, perderiam suas margens de lucro. Eles iriam colocar todo o ganho na mesa”, explica. Como há poucos bancos e pouca gente oferecendo crédito, o banco se apropria da redução da Selic alegando que ainda há clientes em situação complicada por causa da crise. O cliente ainda não viu o beneficio de uma Selic a 6,75%.
Os três principais bancos privados de varejo (Itaú Unibanco, Bradesco e Santander) registraram lucro somado de 53,9 bilhões de reais no ano passado, 15,7% mais do que em 2016. Em relatório, a agência de classificação de risco Moody’s afirmou que a Selic menor acabará reduzindo a rentabilidade dos bancos brasileiros, devido à expectativa de repasse ao consumidor final. No entanto, na mesma semana, o presidente do Itaú Unibanco, Cândido Bracher, afirmou que a maior demanda por crédito este ano impedirá a queda dos spreads. Ele considera que, assim como a Selic, eles chegaram a um piso.
Segundo dados disponíveis no site do BC, apenas cinco bancos concentravam 86% da carteira de crédito no Brasil no terceiro trimestre do ano passado, em um universo de 95 instituições. “É difícil buscar uma explicação plausível que não seja a concentração bancária muito forte que existe aqui. Há um acordo tácito entre pouquíssimos bancos para manter suas margens de lucro no alto”, criticou João Augusto Salles, economista da consultoria Lopes Filho.