Sexta-feira, 27 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 1 de junho de 2019
Poucos previam que, no conclave de 2013, Jorge Bergoglio se tornaria papa, mas o jornalista irlandês Gerard O’Connell, que há 20 anos cobre o Vaticano e conhecia o argentino muito antes de ele se tornar pontífice, acertou o resultado. Agora, ele revela no livro “A Eleição do Papa Francisco: Um relato íntimo do conclave que mudou a história” os segredos daquela eleição que deixou o mundo boquiaberto ao levar não só o primeiro latino-americano mas também o primeiro jesuíta a liderar os mais de 1,2 bilhão de fiéis da Igreja Católica no mundo. As informações são da BBC News.
Confira a seguir os principais trechos da entrevista.
– BBC News Mundo: Os cardeais que participam do conclave não só ficam isolados do mundo como são obrigados a guardar segredo sobre as votações. Como conseguiu desvendar o que ocorreu na ocasião? “Cubro o Vaticano desde 1985 e, ao longo destes anos, criei relações pessoais de confiança com muitos cardeais de todos os continentes. Os cardeais perceberam que houve naquele conclave uma mudança equivalente a um terremoto na Igreja, e alguns deles queriam que as pessoas soubessem como isso aconteceu, então, compartilharam informações comigo para deixar isso registrado na história.”
– BBC News Mundo: Quando os papas João 23, Paulo 6º e João Paulo 2º morreram, os cardeais buscavam há algum tempo um sucessor. No entanto, quando em 11 de fevereiro de 2013, Bento 16 anunciou sua renúncia, a notícia surpreendeu o mundo. Esse ‘fator surpresa’ influenciou de alguma forma a eleição de Bergoglio? “O anúncio da renúncia de Bento 16, o segredo mais bem guardado de seu pontificado, pegou os cardeais completamente de surpresa. Eles não estavam preparados para um conclave e só tiveram 30 dias para eleger um novo papa. A súbita renúncia de Bento 16 significou que não houve tempo para as manobras de lobby que precederam o conclave de 2005 (quando Bento 16 foi eleito).”
– BBC News Mundo: O pontificado de Bento 16 foi marcado por diversos escândalos, incluindo o famoso Vatileaks. Isso contribuiu de alguma forma para os cardeais serem claros sobre que tipo de papa não queriam? “Quando os cardeais se reuniram para eleger o novo papa, tentaram entender o pano de fundo dos escândalos que vieram à tona durante o pontificado de Bento 16. Vários cardeais perceberam que os escândalos eram principalmente relacionados aos italianos, então, concluíram que um candidato que não fosse poderia ser mais indicado para resolver esses problemas. Outros achavam ser necessário alguém que pudesse administrar a Cúria Romana e governar a Igreja. Mas, em nível mais profundo, muitos consideraram os escândalos como resultado de uma crise espiritual e sentiram a necessidade de escolher como papa um homem verdadeiramente santo, um ‘homem de Deus’, em vez de um gerente ou administrador, alguém que pudesse realizar uma reforma espiritual no Vaticano e na Igreja.”
– BBC News Mundo: Quando o conclave começou, as apostas apontavam como favoritos ao italiano Scola, o canadense Ouellet e o brasileiro Scherer. A possibilidade de que o arcebispo de Buenos Aires se tornasse papa nem sequer era cogitada. Quando seu nome começou a surgir como uma possibilidade? “Na véspera do conclave, estes três eram os grandes favoritos. No entanto, muitos cardeais sentiram que nenhum deles oferecia uma liderança verdadeiramente inspiradora e que traria uma nova visão e energia para a Igreja, então, procuraram uma alternativa capaz disso. O nome de Bergoglio surgiu neste contexto. Dos 115 cardeais eleitores, 68 participaram do conclave de 2005, no qual Bergoglio ficou em segundo lugar, e eles sabiam que era um homem profundamente espiritual, não ambicioso, que vivia de uma forma muito simples e austera, que professava um enorme amor aos pobres e que visitava regularmente as favelas de Buenos Aires.”
– BBC News Mundo: Mas em que momento particular o nome de Jorge Bergoglio começou a soar como o de um possível papa? “Antes do início do conclave, ocorrem as chamadas congregações gerais, nas quais os cardeais se preparam para a eleição do pontífice. No penúltimo desses encontros, Bergoglio chamou a atenção de muitos com uma fala de três minutos e meio que foi considerada inspiradora, revigorante e visionária. Suas palavras tiveram um impacto enorme e, a partir desse momento, muitos começaram a vê-lo como o novo papa.”
– BBC News Mundo: O fato de ser latino-americano contou a seu favor? “Sim, por vários motivos. Primeiro, Bergoglio já havia emergido como líder da Igreja na América Latina na Conferência Episcopal Latino-Americana (Celam) realizada em Aparecida, no Brasil, em 2007. Segundo, Bergoglio foi presidente da Conferência Episcopal Argentina por dois mandatos e demonstrou ter boas habilidades de liderança. E terceiro, praticamente todos os cardeais latino-americanos falaram bem dele. Além disso, quase 50% dos católicos do mundo falam espanhol, e a grande maioria deles vive na América Latina. Já no conclave de 2005, muitos votaram em Bergoglio.”