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Os “tais” protocolos

Como médica e psiquiatra, fico me questionando qual impacto isso tudo terá na vida dessas crianças. (Foto: Reprodução)

Tem sido de cortar o coração deixar meu filho de 6 anos na porta da escola. Sinto como se o estivesse deixando em um laboratório gélido, ou sala cirúrgica ou frigorífico, ou algo que não sei nem ao certo descrever. Vejo pessoas tensas, paramentadas e configuradas como robôs para seguir os “tais” protocolos. Homens mascarados cercam meu carro, pedem identificação, as vezes noto que pedem para alguns carros saírem da fila. Não entendo o porquê, quero crer que tenha alguma lógica, mas temo, no meu íntimo, que sentido não há. Em seguida, outro, agora munido de um termômetro apontado para a cabeça do meu filho. Ando mais um pouco, outro, que abre a porta do carro e o conduz até um postezinho de álcool gel frente o qual aquelas mãozinhas pequenas e meio assustadas terão que manejar de se organizar para controlar o tremor e não deixar cair o álcool gel no tênis. No ápice, ele vira para mim e sorri. Vejo pelos olhos, porque a boca estou impedida de ver, tapada pela máscara do Fortnite, única alusão à vida, à diversão, à alegria, à cor, frente ao cenário branco e azul marinho do colégio, uniformes e EPIs. Nunca pensei que um dia eu gostaria tanto do Fortnite. Vida louca, sempre nos surpreendendo.

Ainda assim, aumento o volume do rádio e saio satisfeita porque finalmente as aulas estão retornando e felizmente a escola do meu filho abriu suas portas no primeiro dia em que o governo autorizou, de forma generosa e forte, mostrando seu comprometimento com o propósito de ensinar, acolher e dar exemplo aos seus alunos. Belo colégio, só tenho a agradecer. Gostaria muito de que todas pudessem fazer o mesmo. Mas o importante é que as crianças estão ou irão estar novamente em um ambiente seguro, de aprendizado, brincadeiras, desenvolvimento psicossocial e emocional. Minha outra filha, de 10 anos, ainda está em casa, desde março, sentada todas as tardes frente a um computador, dentro de um quarto, sozinha. Está proibida pelas autoridades de ter aula presencial ainda. Isso salva vidas? Ou destrói? E quando retornar, terá aula presencial em uma semana e na outra on-line, alternando dessa forma até o final do ano pelo menos. Alguém me diz, por favor, esse experimento maluco passou por qual comitê de ética? Quem inventou isso?

Como médica e psiquiatra, fico me questionando qual impacto isso tudo terá na vida dessas crianças. Será mesmo necessário dividir uma turma em duas com uma fórmica e, na educação física, colocar uma corda no meio do campo de futebol ao ar livre, ensolarado, e não deixar as crianças da direita brincarem com as da esquerda?

Com todas as evidências de que se tem até o momento, fico me perguntando como a equipe de enfrentamento da Covid da Prefeitura, do governo do Estado, do Hospital Moinhos de Vento que vem assessorando os colégios particulares da cidade chegam a essas medidas? Terão elas alguma efetividade contra a Covid ou serão elas somente prejudiciais às crianças?

Certamente, vivenciamos incertezas e fomos vítimas de várias medidas insensatas. No início, em minha opinião, aceitamos por prudência e por desconhecimento, mas agora não há mais como aceitar.

Proteção de pessoas nos grupos de risco, salas arejadas, luz solar, lavagens de mãos, cuidados de higiene, medidas ensinadas há séculos nas faculdades de medicina sempre foram preconizadas e é hora de serem levadas muito a sério, e estão léguas de milhas distantes dos novos protocolos das autoridades de saúde do momento.

De novo, a vida nos surpreende; a boa e velha medicina ainda certeira no manejo de um novo problema e esbanjando simplicidade sobre os “neocientistas”.

 

Cláudia Fam Carvalho

Médica Psiquiatra e Psicoterapeuta

 

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