De tempos em tempos, surge um medicamento com o potencial de mudar o mundo. Especialistas afirmam que os mais recentes a oferecer essa possibilidade são os novos medicamentos que tratam a obesidade — Ozempic, Wegovy, Mounjaro e outros que podem chegar ao mercado em breve.
A obesidade afeta quase 42% dos adultos nos Estados Unidos, e mesmo assim, “temos sido impotentes” em combatê-la, afirma Jonathan Engel, historiador de medicina e políticas de saúde na Baruch College em Nova York. A busca para tratamentos médicos para a condição levou a fracassos. As farmacêuticas perderam o interesse e muitos executivos pensavam —assim como a maioria dos médicos e do público em geral— que a obesidade era uma falha moral e não uma doença crônica.
Enquanto outros medicamentos descobertos nas últimas décadas para doenças como câncer, problemas cardíacos e Alzheimer foram encontrados por meio de um processo lógico que levou a alvos claros para os desenvolvedores de medicamentos, o caminho que levou aos remédios para obesidade não foi assim.
Na verdade, muita coisa sobre esses medicamentos permanece um mistério. Pesquisadores descobriram por acidente que expor o cérebro a um hormônio natural em níveis nunca antes vistos na natureza provocava perda de peso. Eles realmente não sabem por quê ou se os medicamentos podem ter efeitos colaterais a longo prazo.
“Todo mundo gostaria de dizer que deve haver alguma ordem ou explicação lógica que permite prever o que funcionará”, avalia David D’Alessio, chefe de endocrinologia da Universidade Duke, no estado da Carolina do Norte, Estados Unidos. Até agora, não há.
Uso contínuo
Embora os medicamentos pareçam seguros, especialistas em medicina da obesidade pedem cautela porque —assim como medicamentos para níveis elevados de colesterol ou pressão alta— os remédios para obesidade podem ser tomados indefinidamente. Caso contrário, os pacientes podem recuperar o peso perdido.
Susan Yanovski, co-diretora do escritório de pesquisa sobre obesidade do Instituto Nacional de Diabetes e Doenças Digestivas e Renais, alertou que os pacientes teriam que ser monitorados quanto a efeitos colaterais raros, mas graves. Especialmente porque os cientistas ainda não sabem por que esses medicamentos funcionam.
Mas, segundo ela, a própria obesidade está associada a uma longa lista de problemas graves de saúde, incluindo diabetes, doenças hepáticas, doenças cardíacas, cânceres, apneia do sono e dores nas articulações.
Os medicamentos podem causar náuseas e diarreia passageiras em alguns pacientes. Mas seu efeito principal é o que importa. As pessoas relatam que perdem os desejos constantes por comida. Elas se sentem satisfeitas com porções muito menores e perdem peso porque naturalmente comem menos —não porque queimam mais calorias.
E os resultados de um ensaio clínico publicado recentemente indicam que o Wegovy pode fazer mais do que ajudar as pessoas a perder peso, também pode proteger contra complicações cardíacas, como ataques cardíacos e derrames.
Sorte?
No entanto, por que isso acontece ainda é pouco compreendido.
“As empresas não gostam do termo tentativa e erro”, disse Daniel Drucker, que estuda diabetes e obesidade no Lunenfeld-Tanenbaum Research Institute em Toronto, no Canadá. Mas, segundo ele, no fim das contas, o resultado foi “sorte”.
A razão pela qual o Ozempic e o Wegovy são muito mais eficazes do que o Saxenda, por exemplo, permanece um mistério. Por que uma injeção semanal produz uma perda de peso muito maior do que uma injeção diária?
Randy Seeley, pesquisador de obesidade na Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, disse que os medicamentos não estão corrigindo a falta de GLP-1 no corpo, hormônio que regula de maneira excepcional o açúcar no sangue —pessoas com obesidade produzem muito desse hormônio. Em vez disso, os remédios estão expondo o cérebro a níveis hormonais nunca antes vistos na natureza.
Dietas
Os pesquisadores continuam a se maravilhar com esses mistérios bioquímicos. Mas médicos e pacientes têm seu próprio entendimento: esses medicamentos funcionam. As pessoas perdem peso. O diálogo constante em suas mentes sobre comida e alimentação desaparece.
E, embora o estigma da obesidade e o estereótipo cultural de que pessoas obesas não estão se esforçando o suficiente para perder peso persistam, alguns especialistas são otimistas. Agora, segundo eles, os pacientes não precisam mais se culpar ou se sentir fracassados quando não conseguem perder peso.
“A era de ‘basta fazer dieta e exercício’ acabou”, comemora Rudolph Leibel, professor de pesquisa em diabetes na Faculdade de Medicina Irving da Universidade Columbia. “Agora, os clínicos têm ferramentas para lidar com a obesidade”, acrescentou.