A pandemia tem dado sinais de arrefecimento com redução na ocupação de UTIs e na média semanal de mortes e especialistas veem perspectiva de melhora gradativa com o avanço da vacinação e certa imunidade conferida pelo grande contingente de infectados pelo coronavírus nos últimos meses. No entanto, alertam que a situação ainda não estará favorável a festas de fim de ano.
A epidemiologista Gulnar Azevedo, presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), diz que a melhora vista até agora pode ser atribuída à vacinação (12,5% da população está imunizada com duas doses ou dose única), mas para dizer se esse processo é sustentável são necessárias mais algumas semanas de diminuição de internações e mortes “As vacinas parecem pegar bem as variantes que estão circulando no País. Mas essa queda nos números tem que ocorrer por mais tempo e de forma mais acentuada”, diz.
Se uma nova variante mais agressiva não aparecer e a vacinação seguir no atual ritmo haveria uma perspectiva mais favorável no fim do segundo semestre. Mas é bem provável que as chamadas medidas não farmacológicas, como uso de máscara e distanciamento social ainda sejam necessárias, afirma Gulnar.
O nome do jogo ainda é a incerteza, define Márcio Bittencourt, do Centro de Pesquisa Clínica e Epidemiológica do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (USP), que não vê todos os adultos acima de 18 anos vacinados com a segunda dose até o fim do ano, a despeito das previsões de autoridades federais e muitas estaduais e municipais. Isso implicaria uma pandemia ainda não controlada.
“A probabilidade de estarmos com tudo controlado no fim do ano é extremamente baixa. Mesmo no Carnaval ainda não vejo essa possibilidade”, afirma o médico que vê as autoridades “excessivamente” otimistas com a vacinação.
“Há grande diferença em dizer que vai oferecer a vacina para todas as faixas etárias e todos os adultos tomarem de fato a vacina”, pondera, lembrando que, neste momento, mesmo parte da população mais idosa, que iniciou a vacinação em fevereiro, não completou o esquema vacinal. “Se 80% da população adulta estiver vacinada com duas doses até dezembro vai superar minha expectativa”.
Mas o pesquisador da USP não vê um novo recrudescimento da pandemia como houve entre março e junho, salvo a entrada de uma nova variante mais transmissível do coronavírus. Além do avanço da vacinação, há uma parcela significativa da população que foi infectada mais recentemente e guarda certo grau de imunidade contra a covid-19.
“Minha impressão é a mesma que eu tinha em abril. Estamos numa fase muito ruim, de transmissão comunitária muito intensa, número de internações e mortes muito alto, mas que parou de subir. Os últimos dias foram os melhores desde março, mas foram muito piores que todo o ano passado”, pondera.
De fato, segundo dados do Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Saúde (Conass), a média móvel de sete dias de mortes cai desde o dia 20 de junho, quando atingiu 2.061.
A de casos recua desde o dia 24 de junho. A Fundação Oswaldo Cruz informou que apenas Mato Grosso tinha crescimento de casos de síndrome respiratória aguda grave, onde a covid-19 é classificada, tendência que não se verificava em nenhuma das 27 capitais. Os leitos de UTI também estavam menos cheios, com apenas três Estados registrando ocupação acima de 90% — Tocantins, Paraná e Santa Catarina. Em São Paulo, o Estado registrou no dia 1 de julho menos de 20 mil pessoas internadas em enfermarias e UTIs pela primeira vez desde 8 de março. A lotação de UTIs está em 72%.
Na perspectiva de Bittencourt, o país deve ver uma queda vagarosa do número de mortes, que podem chegar a 300 ou 500 por dia ao fim do ano, um número “absurdo”, já que existem vacinas.
Mas medidas de contenção seguirão necessárias, como distanciamento e máscara, até o controle total da pandemia. Voltando à incerteza, Bittencourt chama atenção para as novas ondas de infecções provocas pela variante Delta nos Estados Unidos e na Europa, onde vários países estão entrando novamente em lockdown.