Domingo, 29 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 1 de dezembro de 2023
O julgamento foi concluído em agosto, no plenário virtual da Corte mas a tese ainda não havia sido definida.
Foto: Marcello Casal Jr/Agência BrasilNesta semana o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que jornais, revistas e portais jornalísticos podem ser responsabilizados por declarações de seus entrevistados contra terceiros se houver “indícios concretos” de que a informação é falsa.
O voto com maior número de adesões foi proferido pelo ministro Alexandre de Moraes. Conforme o magistrado, a liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio “liberdade com responsabilidade”, admitindo-se, assim, a possibilidade de análise e punição pela publicação de informações “comprovadamente injuriosas”.
O julgamento foi concluído em agosto, no plenário virtual da Corte mas a tese ainda não havia sido definida. Os ministros decidiram que os veículos da imprensa podem ser punidos na esfera cível, por danos morais e materiais, por exemplo, mas apenas se ficar provado que não checaram as informações divulgadas.
Os advogados Gabriel Constantino e Laura Godoy, afirmaram que a tese proposta por Alexandre de Moraes “busca resguardar a liberdade de imprensa e o princípio da intimidade do indivíduo mediante a responsabilização do autor que proferiu as informações falaciosas.”
“Contudo, há que se ponderar que a tese proposta pelo ministro colide com o princípio constitucional da presunção de inocência, ao presumir a culpabilidade do indivíduo alvo da matéria jornalística, condicionando uma eventual responsabilização do veículo de imprensa à comprovação posterior de que aquelas informações publicadas são inverídicas”, ponderaram eles.
A tese fixada foi a seguinte: “Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios.”
O processo foi ajuizado pelo ex-deputado federal Ricardo Zarattini Filho, que foi figura atuante contra o regime militar no País. Em entrevista dada ao jornal Diário de Pernambuco, um simpatizante do período de exceção acusou Zarattini de ter participado de um atentado a bomba em 25 de julho de 1966, no Aeroporto de Guararapes, que matou três pessoas. Representou o ex-parlamentar na causa o advogado Rafael Carneiro.
“O jornal publicou acusações gravíssimas contra o deputado Ricardo Zarattini sem sequer ouvi-lo e sem tomar qualquer providência para checar se havia indício mínimo de veracidade nas falas do entrevistado, o chamado dever de diligência”, afirmou Carneiro. “Esse tipo de conduta pode causar danos irreparáveis para a vida de uma pessoa, pois os leitores presumem que o que é publicado por um meio de comunicação segue os critérios da veracidade. Mesmo que as falas sejam de um entrevistado, ainda assim a imprensa tem o dever de contextualizá-las”, disse Carneiro.
Para André Fini Terçarolli, que defende uma editora, a depender da tese fixada, a decisão pode acabar levando a casos de autocensura, uma vez que os veículos terão de fazer “um controle prévio das respostas do entrevistado”.
“Obriga-se o jornalista a ir atrás de elementos de corroboração da declaração. Sendo tomadas as devidas precauções de amoldar aos parâmetros exigidos para a citação de diálogos alheios, com a colocação de aspas e referências de quem seria seu autor, não haveria que se falar em responsabilidade civil do jornal.”
Já Taís Borja Gasparian, que defende veículos como Folha de S.Paulo e UOL, diz que, também a depender da redação da tese, a decisão pode imputar aos veículos uma responsabilidade que não é deles.
“A opinião de entrevistados, sobretudo a dos entrevistados que são pessoas públicas, é de interesse público, e os veículos tem o dever de divulgação. É importante que essa redação não impute aos veículos uma responsabilidade que não é deles.”
Conforme o ministro do Supremo Alexandre de Moraes, as acusações contra Zarattini não tratavam de fato inédito, mas de acontecimento antigo já “coberto pelo manto” da Lei de Anistia, e há indícios de que o ex-deputado não participou do atentado. O magistrado também disse que o Diário de Pernambuco atuou com “negligência” ao publicar a entrevista.