Ícone do site Jornal O Sul

Pedidos de um guri e de um jurista ao Papai Noel – 2019

(Foto: Shutterstock)

Sou Lenio Streck. Avô do Santiago e do Caetano. Professor universitário, constitucionalista, advogado, fui procurador de Justiça do Rio Grande do Sul e, vejam só, fui também goleiro.

Sempre gostei de futebol. Tenho diploma de comentarista de futebol. Não por menos, quando criança, na minha Agudo, pedia ao Weihnachtsmann, o bom velhinho (ou não), que me trouxesse uma bola e uma camiseta de goleiro. Um cético daria de ombros: Papai Noel não existe; não para uma criança que, de tão pobre, odiava férias (férias significa ficar em casa; ficar em casa significa trabalhar). É óbvio que ele não vem (nota: até hoje fazemos, em casa, a árvore de Natal).

Pois é. Será que foi o velho Santa quem me deu as luvas e camiseta? Coincidência ou espírito de Natal?

Não sei. O que sei é que sou um incorrigível otimista metodológico. Divulgo, aqui na minha coluna de O SUL, minha carta para o Weihnachtsmann, que era como chamávamos o Papai Noel em terras de colonização alemã. Eu tinha de recitar a seguinte “oração”: “Ich bin Klein, mein Herz ist rein, Darf niemand drin wohnen als Jesus allein” (“sou pequeno, meu coração é puro, nele não deve morar ninguém, a não ser Jesus”). Sem pieguice, mas, repetindo isso agora, uma lágrima me pega desprevenido. Isso é como ler O Grande Inquisidor: quando chega na hora em que Jesus beija seu algoz, é impossível chegar ao final sem me emocionar. Meus alunos, e quem me viu em palestras tentando contar, sabem do que falo.

Papai Noel, você bem sabe, as coisas aqui no direito brasileiro não têm sido fáceis. Ganhamos o julgamento da presunção da inocência (que a maioria das pessoas, por desconhecimento ou burrice, é contra), e agora querem nos vencer no tapetão. PN, varinha de marmelo neles!

PN, como tem tanta gente falando mal da Constituição e querendo destruir até cláusula pétrea, ajude-me na fundação do movimento salvacionista chamado Unfucking the Constitution (só posso dizer o nome em inglês porque me recuso a dizer palavrões). Antes que seja tarde demais. Sim, Pai Natal, ajude-me a fazer esse contramovimento. Alguns pedidos têm muito a ver com isso, meu caro Noel.

Vivemos uma época de antiintelectualismo, PN. Burrice e ignorância agora são “coisa fashion”. Você me representa, diz um idiota para o outro. E eles encontram um terceiro e formam um grupo de whatsapp, Pai Natal. Faça-os ajoelhar no milho.

Papai Noel, diga-me: por que aumentou tanto o número de pessoas reacionárias? Por que as faculdades formam tantos fascistas? Por que a comunidade jurídica é a que mais odeia direitos e garantias? Ajude, PN. Conceda-me esse pedido. Não mais permita que se forme tanta gente inculta e jusblasfema.

Papai Noel, livre-nos de tantos coachings e quejandos. Youtbers? Faça-os trabalhar na lavoura, PN. Vão ver o que é atazanar a vida dos outros. Sol no lombo.

PN, sequestre todos os celulares cujos whatsapp estejam fazendo fake news tipo “STF proibiu prisão em segunda instância.” Ah, que jornalistas e jornaleiros levem o Direito a sério e não espalhem mentiras como “o Supremo proibiu a prisão”, “190 mil bandidos perigosos serão soltos” e quejandos.

Mais um pedido: que as pessoas leiam livros. Textos sofisticados. Não fake news de whatsapp ou 240 caracteres de twitter.

Que se volte a respeitar a institucionalidade no país. Que não mais se faça protestos tipo Ku Klux Klan de ministros do Supremo por aí. Ou, então, Pai Natal, ajude a liberar os bingos…se me entende a ironia, velho Noel.

Como viu, são poucos os pedidos, Papai Noel. Assim como eram poucos os meus pedidos de menino de Agudo, terra do Bagualossauro Agudensis, o mais antigo dinossauro do mundo, encontrado a 3 km de onde nasci. Queria apenas uma bola, luvas e uma camisa de goleiro. E quem sabe uma boina e alpargatas… Mas, enfim, homenageando um grande compositor do sul, Cesar Passarinho, sugiro que “oiçam” a música Guri. Vejam que maravilha de letra:

“- Hei de ter uma tabuada e meu livro ‘Queres Ler’… E se Deus não achar muito, tanto coisa que eu pedir…!”

Feliz Natal, leitores da Coluna.

 

Sair da versão mobile