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Colunistas Perdemos tudo, e agora?

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(Foto: Ricardo Stuckert/PR)

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

Falando com meu vizinho sobre a tragédia ocorrida no RS há pouco tempo atrás, ele admite que ainda está esgotado do ocorrido, e que mesmo tendo viajado, fica ainda difícil para ele dar andamento aos desafios que outrora fossem simples. Essa viagem, que deveria ter sido um alívio, acabou não surtindo o efeito esperado. As lembranças e o peso emocional do evento continuam impactando seu dia a dia, mostrando que o trauma vai muito além do espaço físico.

O cuidador do meu carro na garagem já tinha me confessado que não assiste mais nada relacionado às enchentes, porque faz-lhe muito mal. Tem o drenado emocionalmente. E assim vai, com cada pessoa que converse sobre o assunto enchente, a resposta é um suspiro de esgotamento emocional, energético e até físico. A carga emocional desses eventos é claramente visível em cada conversa.

Admiti para ambos, pessoas que não tiveram perdas materiais na maior tragédia do sul, que eu ainda apoio projetos vinculados à reconstrução do RS. Independente do cansaço em todas as ordens, o desenvolvimento de resiliência e força mental e física ao longo dos anos, tem permitido manter o foco, driblando as dificuldades que se apresentam de modo inesperado e aleatório. É um esforço contínuo para manter a motivação e a esperança, mesmo quando tudo parece nos drena e esgota ao redor.

No entanto, a resistência, adaptação e superação não são habilidades ensinadas na escola ou em cursos de formação profissional. Habilidades importantes, ainda mais se considerarmos que as perdas materiais têm tido o maior impacto na população riograndense. Em muitos casos, pela segunda ou terceira vez.

Os objetos possuem valor sentimental porque estão associados a memórias específicas e significativas. Em muitos casos, podem ser uma extensão da identidade de um indivíduo, refletindo gostos, interesses, conquistas e a própria história de vida. A perda desses objetos pode ser vista como uma perda de uma parte de si mesmo. É como se uma parte da nossa história fosse arrancada, deixando um vazio que é difícil de preencher.

Alguns bens oferecem uma sensação de segurança e conforto, outros trazem valor simbólico que vão além do valor material. Podem representar conquistas, sacrifícios e também relacionamentos e conexões emocionais. Perder estes objetos simboliza perda na conexão ou perda de significados. Cada item perdido é uma memória que se vai, um símbolo de um tempo que não volta mais.

A sensação de luto ao perder coisas, objetos, elementos envolve várias camadas de significados emocionais e psicológicos. A perda não é apenas física, mas simbólica, emocional e muitas vezes existencial. É um processo de luto complexo que pode levar muito tempo para ser superado.

O “ter” tem substituído o “ser” há muito tempo atrás. No entanto, a sociedade aos poucos está começando a valorizar a importância da essência do indivíduo. Porém, ainda compramos o curso de meditação, pagamos a nutricionista e vamos de carro à academia. Ainda são atitudes externas, objetos, coisas que pagamos para ter alguma coisa. Estamos presos em um ciclo de consumo que muitas vezes nos distancia de quem realmente somos.

Não podemos simplesmente agradecer à vida, quando perdemos nossa casa. Com tudo, é o momento propício de questionarmos o estilo de vida que tem nos levado ao apego desenfreado pelo consumo, pela acumulação e pela falta de desenvolvimento de quem somos e não do que temos. Precisamos rever nossos valores e entender o que realmente importa.

Seguido das perdas materiais, existe o momento da reconstrução, do retorno, da volta para casa ou para o trabalho. No momento de maior apreensão e preocupação, fica quase impraticável refletir sobre as mudanças precisas para evitar sofrer novamente. Em síntese, refletir sobre uma mudança de paradigma da própria existência. É um período de grande vulnerabilidade, mas também uma oportunidade para reavaliar nossas prioridades e objetivos.

Não obstante, a tragédia já aconteceu. Direta ou indiretamente, todos fomos afetados no estado do Rio Grande do Sul. Todos voltamos às nossas rotinas e precisamos considerar a importância de mudar nosso paradigma. Caso contrário, continuaremos a enfrentar sofrimento crescente e recorrente. A mudança é urgente e necessária para que possamos construir um futuro mais resiliente e sustentável.

O planeta sofreu transformações significativas. Somos constantemente atraídos e até absorvidos pelos celulares, pelas diversas mídias sociais e pelas fake news, o que torna nossa visão da realidade ainda mais complexa e desafiadora. No entanto, se almejamos construir uma nova vida plena e feliz, não há mais espaço para a negação da realidade. É imprescindível encararmos os fatos com lucidez e responsabilidade.

É crucial revisar e revalorizar nosso relacionamento perante as coisas, perante a natureza, o consumo e a definição do que somos. Precisamos restabelecer uma conexão mais profunda e significativa com o mundo ao nosso redor.

Vamos evitar novas tragédias e refletir sobre as ações que podemos aprimorar, os erros que devemos corrigir, as coisas que não precisamos consumir, e como podemos crescer e evoluir a partir do que somos, ao invés de sermos avaliados pelo que possuímos. É um chamado para uma mudança profunda e duradoura em nossa maneira de viver e de nos relacionar com o mundo.

CRIS LJUNGMANN é criadora do programa MENTORA, atende profissionais e empreendedores procurando mudança; Antropóloga; Mindsetter do Instituto Dynamic Mindset; membro do GRUPO FRONT

*g.frontoficial@gmail.com

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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