Quinta-feira, 23 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 11 de agosto de 2021
Manter um estilo de vida fisicamente ativo pode ser uma estratégia para turbinar a resposta imune induzida por vacinas contra a covid-19. Essa é a conclusão de um estudo feito com 1.095 voluntários por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e colaboradores. Os dados foram divulgados, ainda sem revisão por pares, na plataforma Research Square.
O benefício proporcionado pela atividade física foi observado principalmente entre os participantes que se mantinham ativos ao menos 150 minutos por semana e não apresentavam comportamento sedentário, ou seja, não passavam mais de oito horas diárias sentados ou deitados.
Considerou-se como “tempo ativo” tanto aquele dedicado aos exercícios e outras atividades de lazer (caminhada, corrida, dança, natação, passear com o cachorro etc.), como também às atividades domésticas (limpar a casa, cuidar do jardim, lavar a roupa na mão), ao trabalho (carregar pesos, realizar consertos) e aos deslocamentos de rotina (andar a pé ou de bicicleta até o trabalho, o supermercado ou a escola, por exemplo).
O nível de atividade física foi mensurado por meio de entrevistas telefônicas. Foram considerados “ativos” os voluntários que relataram ao menos 150 minutos de atividades semanais, somando os vários domínios analisados.
“Uma pessoa que corre durante uma hora todos os dias e passa o resto do tempo sentada em frente a uma tela é considerada ativa e sedentária ao mesmo tempo. Nós combinamos esses dois conceitos diferentes em nossa análise”, explica Bruno Gualano, professor da Faculdade de Medicina (FM-USP) e primeiro autor do artigo.
“Quando olhamos para os dados, percebemos claramente que eles formam uma ‘escadinha’: no alto, com a melhor resposta vacinal, estão os ativos não sedentários. Na sequência, vêm os indivíduos ativos e sedentários. Por último, os inativos e também sedentários”, conta.
Todos os participantes da pesquisa foram imunizados com a Coronavac entre fevereiro e março de 2021. Amostras de sangue para análise foram coletadas logo após a aplicação da segunda dose, bem como 28 e 69 dias depois.
A qualidade da resposta vacinal foi avaliada por meio de diversos testes laboratoriais, sendo os principais aqueles que mensuram a produção total de anticorpos contra o Sars-CoV-2 (IgG total) e a quantidade específica de anticorpos neutralizantes (NAb) – aqueles capazes de impedir a entrada do vírus na célula humana.
De acordo com o critério adotado pelos pesquisadores, atingiram a chamada “soroconversão” os voluntários que no exame de IgG total apresentaram pelo menos 15 unidades arbitrárias (UA) de anticorpos por mililitro (mL) de sangue.
No caso dos anticorpos neutralizantes, considerou-se uma resposta positiva quando, no ensaio in vitro feito com o plasma sanguíneo, observou-se ao menos 30% de inibição da ligação entre o SARS-CoV-2 e o receptor da enzima conversora de angiotensina 2 (ACE2, na sigla em inglês) – proteína existente na superfície de algumas células humanas à qual o vírus se conecta para viabilizar a infecção.
Análise dos dados
Como informa Gualano, o objetivo primordial do projeto de pesquisa de qual seu artigo é fruto era avaliar a segurança e a efetividade da Coronavac em portadores de doenças reumáticas autoimunes, entre elas artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico, artrite psoriática, vasculite primária e esclerose sistêmica. Grande parte desses pacientes faz uso de medicações que reduzem a atividade do sistema imune e, portanto, uma resposta vacinal mais fraca era esperada.
Um primeiro trabalho publicado na Nature Medicine, sob a coordenação da professora da FM-USP Eloísa Bonfá, confirmou a segurança da vacina e mostrou que ela induz uma resposta aceitável, ainda que reduzida, nesse grupo de pacientes.
Foram incluídos na análise final 898 pacientes imunossuprimidos. Desses, 494 foram classificados como ativos e 404 como inativos. Além disso, como uma espécie de grupo controle, participaram 197 voluntários sem doença autoimune – 128 ativos e 69 inativos.
Um modelo matemático foi usado pelos pesquisadores para compensar possíveis distorções que variáveis como idade, sexo, índice de massa corporal (IMC) e uso de imunossupressores poderiam causar. Isso porque, sabidamente, o funcionamento do sistema imune é diminuído em indivíduos idosos e em usuários de corticoides e outros moduladores imunológicos, assim como possivelmente em obesos.
Na comparação ajustada, os pacientes imunossuprimidos fisicamente ativos apresentaram uma chance 1,4 vez maior de atingir a soroconversão.
O fato de ser fisicamente ativo também foi associado a um aumento de 32% na quantidade de anticorpos contra as regiões “S1” e “S2” da proteína spike (S) – usada pelo vírus para se conectar ao receptor ACE2 e entrar na célula humana.
Já entre os voluntários sem doença autoimune, a chance de soroconversão foi 9,9 vezes maior entre os fisicamente ativos e observou-se um aumento de 26% na quantidade de anticorpos contra a proteína spike. Como o número de voluntários era menor nesse subgrupo, os dados referentes aos anticorpos neutralizantes também não apresentaram significância estatística.