Além do aumento da inclusão financeira, o Pix trouxe um impacto imprevisto: o sistema de pagamentos instantâneos tem ajudado a reduzir a inadimplência entre os devedores de menor renda. A conclusão faz parte de um levantamento da MGC Holding, empresa especializada em recuperação de ativos, referente ao comportamento e perfil dos endividados em 2023.
Segundo o sócio-diretor da empresa, Eduardo Martins, “a entrada do Pix mudou bastante o mercado [de recuperação de crédito]”. A pesquisa mostra que no ano passado a maioria ou 57% dos pagamentos de dívidas em atraso foram feitos pelo sistema de transferência instantânea, ante 43% de boletos e carnês.
Além de ter se tornado principal canal de pagamento de acordos, quem escolhe o Pix apresenta mais efetividade, ou seja, apresenta maior regularidade e adimplência comparado às pessoas que escolheram boleto: 89,4% no sistema digital contra 53% no método tradicional.
O levantamento da MGC mostra ainda outro indicador que ressalta a maior efetividade dos usuários de Pix. A taxa que mede a relação de acordos até a final liquidação – quanto menor melhor – foi a menor da história em 2023, afirma Martins. O índice do ano passado ficou em 1,17 vez, contra 1,37 em 2022, 1,71 em 2021 e 2,11 em 2020.
O especialista explica ainda que, junto com o Pix, a adesão ao programa Desenrola, que teve início em outubro de 2023 e terminou em março deste ano, impulsionou uma queda do endividamento na faixa de menor renda da população, enquanto a situação se manteve inalterada entre os devedores mais ricos.
A pesquisa mostra que 40,6% dos acordos de quitação de dívidas atrasadas no ano passado foram para pagamento à vista. Trata-se de aumento de quase 7 pontos percentuais ante os 33,9% da média de anos anteriores.
Entre os que parcelaram as pendências, 27% optaram por até três pagamentos, ante 19% em 2022. Na visão do sócio da MGC, a conclusão é que os devedores buscam liquidar o débito à vista ou em prazos menores.
A priorização de pagamentos de dívidas de até dois anos, com 28,7% do volume global de renegociações, contra 18% na média de anos anteriores, provavelmente, representa um impacto do Desenrola, pondera Martins.
O sócio da MGC afirma ainda que os dados indicam uma tendência de se querer negociar descontos maiores. Segundo a pesquisa, o valor médio dos acordos tem caído e chegou a R$ 1.154,10 em 2023, em comparação com R$ 1.338,10 de anos anteriores, uma queda de cerca de 14%.
O levantamento mostra ainda que acordos de prazos mais curtos apresentam índices de pagamento em dia maiores. Os acordos de até três parcelas apresentam uma taxa de 25% de adimplência, enquanto aqueles com até 15 parcelas chegam a 1,8%.
A parcela média dos acordos no ano passado foi de R$ 100,9 por mês. Martins ressalta que o valor representa a quantia que as famílias puderam reservar para o pagamento de dívidas em 2023.
Outra tendência reforçada pelo levantamento é a de priorização do fechamento de acordos por canais digitais. Segundo o estudo, 77,8% fizeram negociações por sites, aplicativos e Whatsapp em 2023 contra 73,9% em 2022 e 64,1% em 2021. “O dado mostra que o setor de call centers passa a sofrer maior pressão”, diz o executivo. “Muitas empresas do setor podem começar a ter dificuldades financeiras”, acrescenta.
Em termos de perfil das dívidas, o levantamento mostra que, na média, 40% do endividamento das famílias vêm de cartões de crédito; 13% do cheque especial; 12% de cartões de lojas; 11% de financiamento de produtos; 15% de créditos especiais, veículos, imóveis e outros bens.
O maior peso para o orçamento dos endividados recai sobre o cartão de crédito. Cerca de 68% alegam ter pelo menos 50% da renda comprometida com cartões de crédito. Outros 32,2% afirmam ter 100% da renda comprometida com esse produto.
Na visão por renda, 70% das famílias endividadas informaram ter renda até 2 salários-mínimos; 15%, de 2 a 3 salários; 9% de 3 a 5 salários; e 6%, mais de 5 mínimos. Do total da base de devedores, 26,9% recebe algum tipo de auxílio do governo: 55,3% seguro-desemprego e 36,9% auxílios federais diversos. A dívida média de quem recebe auxílio alcança R$ 1.227 e é maior do que quem não recebe, de R$ 989. As informações são do jornal Valor Econômico.