O número de novas ações contra planos de saúde cresceu quase 33% em apenas um ano no Brasil. A quantidade chegou a 234,1 mil processos em 2023, segundo dados do CNJ – a média, assim, é de 641 novos processos diários específicos. E como cada dia tem 1.440 minutos, há uma nova ação a cada dois minutos, contra uma, duas, três, quatro, etc. das 680 operadoras médico-hospitalares ativas. Destas, segundo a ANS (Agência Nacional da Saúde), as cinco maiores são Bradesco Saúde, Amil, Notre Dame, Unimed e Hapvida.
A Lei 14.454/2022 abriu brecha para os beneficiários de planos de saúde de todo o País demandarem todo tipo de tratamento, independentemente de indicação clínica e evidência científica. O gasto das operadoras com condenações judiciais teria sido, segundo elas, de R$ 5,5 bilhões no ano passado – o valor foi 37% maior do que o de 2022.
“Não existe lista aberta infinita em nenhum setor porque os recursos são limitados. (A lei) criou uma expectativa na sociedade e uma abertura que o sistema não comporta”, diz Vera Valente, diretora executiva da Federação Nacional da Saúde Suplementar (FenaSaúde).
Valente afirma que muitas das demandas judiciais são por tratamentos que não estão no rol da ANS ou para indicações que não seguem os protocolos clínicos. “O Zolgensma (remédio para atrofia muscular espinhal que custa mais de R$ 5 milhões) tem uma diretriz para ser indicado para crianças de até 6 meses, mas já vimos pedidos do medicamento para pacientes de 19 anos”, afirma.
De acordo com Gustavo Ribeiro, presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), o cenário criado pela lei do rol exemplificativo cria insegurança jurídica e ameaça a sustentabilidade do setor. Ribeiro lembra que três grandes empresas internacionais do mercado de seguros – United Health Group (UHG), Allianz e Sompo – deixaram de operar no setor saúde no Brasil.
“A única coisa que explica a saída dessas gigantes do Brasil é a insegurança jurídica, porque elas não enfrentam situação semelhante em lugar nenhum do mundo”, afirma o presidente da Abramge.
Já para especialistas e entidades de defesa do consumidor, a alta de ações contra os convênios médicos deve-se à piora da qualidade do serviço prestado e ao aumento de práticas abusivas pelas operadoras, como negativas de cobertura, reajustes elevados e cancelamentos unilaterais de contratos de pacientes em tratamento. Para eles, a alta de processos pode ser associada também com as demandas de saúde que ficaram represadas na pandemia.
Dessa forma, destacam, não é possível saber se há tendência sustentada de alta no número de processos ou se o crescimento no ano passado é só o retorno do patamar normal de ações registrado antes da pandemia.
“O que aconteceu foi que a saúde suplementar foi freada nos anos da pandemia e as pessoas deixaram de buscar demandas. Em 2022 e 2023, houve retomada”, salienta Lucas Andrietta, coordenador do programa de Saúde do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec).
Para o coordenador do Idec, houve demanda de saúde ‘freada’ e, em 2022 e 2023, ocorreu uma retomada.