Quarta-feira, 08 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 7 de janeiro de 2025
Áudios de WhatsApp obtidos pela Polícia Federal (PF) revelaram uma série de conversas entre políticos e empresários que sugerem a discussão sobre um suposto esquema de desvio de emendas de comissão encaminhadas pelo líder do governo Lula na Câmara dos Deputados, José Guimarães (PT-CE), para a área da saúde no município de Choró, no sertão do Ceará.
O conteúdo das mídias obtidas pela investigação foram divulgadas pela “Revista Piauí” na semana passada. Conforme a publicação, as conversas foram encontradas no celular do prefeito eleito da cidade, Bebeto Queiroz (PSB), que foi impedido de tomar posse no último dia 1º e está foragido da Justiça. Ele é suspeito de compra de votos e foi alvo de um mandado de busca e apreensão no dia 4 de outubro.
Nas conversas interceptadas pela PF, o prefeito foragido discutia o desvio de verba com o empresário Carlos Douglas Almeida Leandro, que foi preso no início de dezembro por participar de um esquema de fraude na locação de veículos para a Prefeitura de Pindoretama, também no Ceará.
“Ei, o Ilomar ligou aqui oferecendo a emenda do Guimarães pra… justamente pro caixa. Aí… qual a tua proposta? Tanto tem a opção pra saúde como tem pra infraestrutura, pavimentação ou saneamento”, disse o empresário em mensagem enviada em 13 de setembro de 2024. Em resposta, Bebeto teria dito: “Eu só quero saúde e amanhã a gente conversa sobre isso, cara. Veja quanto é que ele tem de saúde… pra inteirar. O Guimarães, tem que ter a reunião com o Guimarães.” A expressão “pro caixa” é interpretada como uma possível referência a caixa dois. A proposta, disse o empresário, veio de Ilomar Vasconcelos (PSB), vice-prefeito de Canindé, cidade próxima a Choró.
Pouco depois, segundo a Polícia Federal, o prefeito eleito de Choró encaminhou um áudio para Adriano Almeida Bezerra, secretário parlamentar do deputado federal Júnior Mano (PSB-CE), ressaltando o percentual que supostamente pretendia desviar da emenda parlamentar. “Ei, meu fi, vou te passar aqui o telefone. O pessoal do Guimarães quer fazer um negócio de um milhão e meio de emenda de saúde, aí eu quero que meu fi veja aí. Vou mandar eles te ligar, viu. Que aí eu fico mais… no máximo 12%. Indicação pra Choró. Aí indica agora dia 6 de outubro. Aí já é logo carimbada”, teria dito Bebeto Queiroz. “Pronto. Arroxa”, teria respondido, por escrito, Adriano Bezerra.
À época da conversa, Júnio Mano era filiado ao PL, mas foi expulso do partido por apoiar o candidato do PT à Prefeitura de Fortaleza, Evandro Leitão, ao invés de André Fernandes, candidato de oposição ao partido petista. Segundo publicado pela Piauí, a PF enxerga que a relação entre Bebeto e Júnio Mano é “marcada por uma combinação de subordinação, cooperação e articulação política-financeira” que “estruturou um sistema de corrupção baseado no direcionamento de emendas parlamentares, uso de caixa dois e manipulação eleitoral estratégica”.
A Polícia Federal ainda afirma que o parlamentar teve um “papel central” no esquema envolvendo a Prefeitura de Choró. A emenda em questão, de R$ 1,5 milhão, foi aprovada pela Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados para o Fundo Municipal de Saúde de Choró. A verba foi repassada integralmente ao município. O percentual citado para o suposto desvio, de 12%, seria de R$ 180 mil. À Piauí, José Guimarães disse não conhecer o assessor de Júnio Mano com quem Bebeto discutiu o possível desvio da emenda.
Emendas
As emendas parlamentares entraram na mira do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), que bloqueou o pagamento de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão e determinou que a Câmara dos Deputados respondesse a questionamentos a respeito da destinação dos recursos.
Emendas do mesmo tipo indicadas pelo Senado Federal também foram suspensas por Dino devido à suposta falta de transparência e rastreabilidade. Dino, contudo, acabou concordando com a liberação de parte dos recursos, de R$ 370 milhões, necessários para garantir o gasto mínimo com a saúde determinado pela Constituição Federal. A decisão ocorreu após alerta feito pela Advocacia-Geral da União (AGU).
Parte dos parlamentares da Câmara Federal acreditam que haja coordenação entre o bloqueio de emendas e o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Deputados da base do governo, inclusive, já indicariam que a questão só seria resolvida com a liberação, ao menos em parte, de emendas. Outros parlamentares enxergam alinhamento entre as decisões do ministro Flávio Dino com articulações do presidente, o que tem causado dificuldade na tramitação de projetos no Congresso.
O bloqueio das emendas por parte do ministro do STF acontece durante um período de alta tensão política na Câmara, quando projetos ficaram parados por quase um mês na Casa em razão do impasse da liberação dos recursos.