O ativista bielorusso Ales Bialiatski, preso sem julgamento desde 2021 pelo regime de Lukashenko, e as organizações dos direitos humanos Memorial, da Rússia, e Centro pelas Liberdades Civis, da Ucrânia, foram escolhidos nesta sexta-feira (7) como ganhadores do Prêmio Nobel da Paz de 2022.
A decisão do Comitê Norueguês do Nobel, que homenageia vozes críticas ao presidente Vladimir Putin e a Alexander Lukashenko, seu aliado em Minsk, coincide com o agravamento da invasão russa na Ucrânia, que entrou em seu oitavo mês.
Criticado ao longo de décadas por decisões controversas — ou por evitar controvérsias políticas —, o Comitê não se esquivou de defender a democracia e a “coexistência pacífica nos países vizinhos: Bielorrússia, Rússia e Ucrânia”. Era necessário deixar claro “que estamos falando de dois regimes autoritários e de uma nação em guerra”, afirmou Berit Reiss-Andersen, sua presidente, enfatizando a importância da sociedade civil na promoção de valores pacíficos:
“Os ganhadores do Nobel da Paz representam a sociedade civil em seus países. Há muitos anos eles promovem o direito de criticar o poder e proteger os direitos fundamentais dos cidadãos”, afirmou Reiss-Andersen. “Eles fizeram esforços notáveis para documentar crimes de guerra, abusos de direitos humanos e de poder. Juntos, demonstram o significado da sociedade civil para a paz e a democracia”, completou ela no anúncio, feito às 11h em Oslo, na Noruega (6h, horário de Brasília).
Reiss-Andersen disse que “infelizmente” sempre há guerras em algum canto do planeta, mas que este ano a decisão foi tomada diante do “incomum” conflito na Europa e de seu impacto global, com “as ameaças de uso de armas nucleares e escassez de alimentos”. Ela negou, contudo, que a escolha deva ser lida como um recado ou presente de aniversário às avessas para Putin, que completa 70 anos nesta sexta:
“Esse prêmio não é dirigido a Vladimir Putin, nem por seu aniversário ou em nenhum outro sentido, exceto pelos atos de seu governo que, como o governo da Bielorrússia, representa um governo autoritário que reprime os ativistas”, afirmou, respondendo a uma jornalista.
Bialiatski, que está preso sem julgamento desde 2021 pelo regime de Lukashenko, esteve na vanguarda do movimento pró-democracia em Minsk, ainda nos anos 1980, “dedicando sua vida à promoção da democracia e do desenvolvimento pacífico de seu país natal”. Em 1996, ele fundou a Viasna (Primavera), que nos anos seguintes se transformou em uma organização dos direitos humanos que documenta violações e protesta contra o uso de tortura contra prisioneiros políticos.
Bialiatiski não era o bielorrusso mais cotado para levar o prêmio deste ano, mas sim a líder da oposição Svetlana Tikhanovskaya, que fez frente ao regime nas eleições presidenciais de agosto de 2020. Os protestos antigoverno, que já eram registrados antes do pleito contestado internacionalmente, ganharam nova dimensão após a derrota de Tikhanovskaya — que só se tornou candidata para substituir seu marido, que havia sido preso.
O novo ganhador do Nobel era um dos integrantes do Conselho de Coordenação, órgão criado para tentar negociar uma transição pacífica de poder em meio aos atos duramente reprimidos pelo governo de Lukashenko, que está no poder desde 1994, forçando quase todas as lideranças de oposição a fugirem do país ou prendendo-as.
Bialiatiski foi preso em julho de 2021 por evasão fiscal, sem evidências, acusação que posteriormente foi trocada para “contrabando”. Ele já havia sido detido antes, passando quatro anos e meio atrás das grades desde 2011 — outra prisão classificada como política.
“Nossa mensagem é fazer um apelo para que as autoridades bielorrussas soltem Bialitski. Nossa esperança é que isso aconteça e que ele venha a Oslo para receber o prêmio que lhe foi concedido”, disse Reiss-Andersen, antes de admitir que seu pedido dificilmente será ouvido. “Mas há milhares de presos políticos na Bielorrússia, e temo que meu desejo não seja muito realista.”
Em resposta, a Chancelaria bielorrussa ironizou no Twitter a lista de vencedores, afirmando que o Nobel da Paz tem sido “tão politizado” que Alfred Nobel está “se revirando no túmulo”. A mulher de Bialitski, Natallia Pinchuk, disse que mandou um telegrama para a prisão avisando sobre o prêmio, mas que não sabe se seu marido foi informado.