O presidente da Argentina, Javier Milei, alfinetou seu homólogo brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, ao afirmar que “somente um tirano pode dar aval a tal ato de opressão”, fazendo uma referência à suspensão da rede social X no Brasil devido ao impasse entre a plataforma do bilionário Elon Musk e o Supremo Tribunal Federal (STF).
“Olhemos o Brasil, onde a Justiça proibiu o X, que nada mais é do que a arena pública para expressar sua voz e dissidência. Querem proibir o espaço de troca de ideias. Somente um tirano, que erra em tudo, pode dar aval a tal ato de opressão. Grande parte do jornalismo nacional clama pelo antigo formato do Twitter que tinha a censura dos wokes [termo em inglês usado para desqualificar militantes e causas progressistas], clamam pelo direito à liberdade de expressão apenas para si e pedem a censura de quem pensa diferente”, disse Milei.
Uma provocação similar foi feita recentemente pela ministra das Relações Exteriores da Argentina, Diana Mondino. Em uma publicação recente no X, a chanceler expressou preocupação com o cenário no qual “cada vez mais países restringem a livre expressão em redes”. Apesar de não fazer nenhuma citação direta, a fala causou mal-estar entre setores do governo brasileiro, que interpretaram a frase como uma referência à disputa do STF com o X.
“Na Argentina existe livre expressão porque respeitamos a Constituição Nacional. Um dos objetivos deste primeiro governo de Milei é transformar a Argentina num farol da liberdade”, acrescentou a chanceler argentina. O presidente republicou o post nas suas redes.
Relação tensa
As declarações de Milei foram consideradas “inaceitáveis” por fontes do governo brasileiro. A resposta à Casa Rosada está sendo analisada no Palácio do Planalto e no Itamaraty, e as possibilidades são várias. Setores do governo defendem a suspensão de reuniões de alto nível entre os dois países, a convocação do embaixador brasileiro em Buenos Aires, Julio Bitelli, e um atraso na apresentação das cartas credenciais do embaixador argentino no Brasil, Daniel Raimondi, entre outras.
Embora Milei não tenha citado Lula, a fala do presidente argentino causou profundo mal-estar no governo brasileiro. Depois de afirmar que devemos “olhar para o Brasil”, Milei afirmou que a Justiça brasileira é “dependente do poder petista”. Segundos depois, o chefe de Estado argentino, que fizera menção à decisão do STF de “proibir o X”, disse que “somente um tirano pode dar aval a semelhante ato de opressão”.
Na avaliação de fontes do governo brasileiro, “Milei não menciona Lula, mas no contexto de sua fala, a intenção fica clara” e, de acordo com as mesmas fontes, “diante de um ataque desta natureza, não se pode deixar de defender o presidente [brasileiro]”. Outra fonte disse que Milei desconhece a divisão de poderes que existe numa república.
Troca de afagos
Elon Musk e Javier Milei também têm trocado mensagens de apoio. Em uma publicação recente, o bilionário disse que “o exemplo que você [Milei] está dando na Argentina será um modelo que ajude o resto do mundo”. A resposta do ultraliberal foi que “trabalhamos para mostrar ao mundo que abraçar as ideias da liberdade traz prosperidade”.
O presidente argentino também republicou um post no qual Musk publicou uma foto do ministro do STF Alexandre de Moraes com a seguinte legenda: “Este tirano do mal é uma desgraça para juízes com toga” — o dono do X havia republicado um post sobre uma tentativa de abrir um processo de impeachment contra Moraes no Congresso brasileiro.
O presidente argentino também republicou vários posts do jornal La Derecha Diario, propriedade de empresários próximos a Milei, que falam sobre a tentativa de Musk de utilizar a Starlink, outra empresa do bilionário, para driblar a suspensão do X por parte do STF.
Meses antes da situação no Brasil escalar, o presidente argentino chegou a se encontrar com o bilionário sul-africano no estado do Texas, na qual ofertou “colaboração” no impasse. Já naquele período, Musk vinha fazendo ataques a Moraes e ameaçando descumprir suas ordens. Durante o encontro, Milei disse que se os funcionários da rede social decidissem migrar para Argentina, eles teriam “mais liberdade”.