Segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 9 de junho de 2024
A Polícia Federal (PF) deve pedir em breve a extradição de condenados pelos ataques de 8 de janeiro que fugiram para a Argentina. A deflagração de uma nova fase da megaoperação Lesa Pátria, nesta quinta-feira, apontou que pelo menos 65 envolvidos com a depredação em Brasília estariam no país vizinho, e que parte deles teria, inclusive, pedido refúgio ao governo de Javier Milei. Mas o que o mandatário argentino, aliado de primeira hora do ex-presidente Jair Bolsonaro, poderia fazer diante de uma solicitação neste sentido por parte do Brasil?
Em 2006, o Acordo de Extradição entre os Estados Partes do Mercosul, assinado pelos países-membro do grupo em 1998, foi promulgado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que cumpria à época a reta final de seu primeiro mandato. O texto do documento prevê que os signatários “obrigam-se a entregar, reciprocamente”, pessoas que “se encontrem em seus respectivos territórios e que sejam procuradas pelas autoridades competentes de outro Estado Parte”. O imbróglio atual, contudo, não é tão simples.
Rodrigo Faucz, pós-Doutor em Direito Criminal pela UFPR e advogado habilitado a atuar no Tribunal Penal Internacional, frisa que o acordo interno do Mercosul prevê que solicitações de extradição possam ser ignoradas no caso de crimes considerados de natureza política. “A mera alegação de um fim ou motivo político não implicará que o delito deva necessariamente ser qualificado como tal”, pondera um dos artigos do tratado.
“É uma regra que possui particularidades em cada país, mas é amplamente aceita pela comunidade internacional. O asilo político é uma exceção à extradição, pois visa proteger pessoas perseguidas por motivos políticos e tem uma margem de discricionariedade considerável”, afirma o especialista, sem se debruçar sobre o caso específico dos réus pelo 8 de janeiro.
Além disso, uma eventual solicitação de extradição também poderia ser negada pela Argentina com base em um outro acordo firmado entre as duas nações justamente durante o governo Bolsonaro. O texto foi assinado pelo ex-ministro da Justiça Sérgio Moro e estabelece que os delitos passíveis de extradição incluem aqueles com pena máxima privativa de liberdade superior a dois anos ou em casos nos quais o tempo restante a ser cumprido pelo réu supera o período de um ano.
O acordo prevê que os pedidos precisam ser formalizados pela via diplomática e devem incluir uma cópia da sentença condenatória e uma declaração sobre o montante da penalidade que ainda deve ser cumprida, além de um documento que determina se a sentença é final ou é exequível.
Entretanto, o artigo 3º do texto determina que a recusa da extradição pode ocorrer caso a parte requerida acredite que o pedido tenha “propósito de perseguir ou punir uma pessoa em razão de raça, sexo, condição social, religião, nacionalidade ou opinião política”. O país também pode negar o pedido se tiver concedido asilo ou refúgio à pessoa reclamada.
A Polícia Federal mapeou o paradeiro dos 65 condenados que seguiram para a Argentina e repassará os dados ao Supremo Tribunal Federal (STF), responsável por emitir a ordem de extradição. Com isso, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), ligado ao Ministério da Justiça, emitirá o pedido formal ao país vizinho.
Busca por refúgio
A PF tem informações de que parte dos foragidos pediu refúgio ao governo de Javier Milei e de que alguns não passaram pelas barreiras migratórias. Os alvos que não foram encontrados também terão os nomes incluídos no Banco Nacional de Mandados de Prisão. Com isso, seus nomes ficarão públicos e qualquer pessoa que localizar os foragidos pode acionar a polícia para realizar a prisão.
As apurações apontam que os brasileiros podem ter entrado no país vizinho até mesmo em porta-malas de veículos. Outros fugiram a pé pela ponte na fronteira, ou atravessando o rio Paraná. Todas as fugas ocorreram em 2024.
No mês passado, uma reportagem revelou que condenados e investigados pelos atos golpistas haviam quebrado tornozeleiras eletrônicas que usavam por determinação do STF, e fugido para a Argentina ou para o Uruguai. Em seguida, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu a inclusão dos fugitivos na difusão vermelha da Interpol.