Com um aperto de mão, mas sem expectativas de grandes mudanças, os presidentes da Venezuela, Nicolás Maduro, e da Guiana, Irfaan Ali, encerraram, nessa quinta-feira (14), uma aguardada reunião em meio à escalada de tensões na antiga disputa pelo Essequibo. Enquanto Ali declarou que o mapa de seu país seguirá inalterado, o governo venezuelano afirmou que pretende “continuar com o diálogo para resolver a controvérsia” sobre este território rico em petróleo que compreende mais de dois terços da Guiana.
“Exijo respeito à nossa soberania”, disse Ali em entrevista a jornalistas após o encontro com Maduro, que ocorreu em Kingstown, São Vicente e Granadinas, no Caribe. “Não há narrativas, propagandas que vão alterar o mapa de Guiana.”
Ali também afirmou que seu país “tem todo o direito (…) de facilitar qualquer investimento, qualquer parceria (…), a emissão de qualquer licença e a outorga de qualquer concessão em nosso espaço soberano”.
Por sua vez, Caracas considerou a reunião “bem-sucedida”, e afirmou, por meio de seu Ministério de Comunicação e Informação, que “manifesta a sua vontade de continuar o diálogo para resolver a controvérsia em relação ao território”. O órgão também postou um vídeo no X (antigo Twitter) mostrando um aperto de mão entre os dois presidentes ao fim do encontro.
Este foi o primeiro diálogo direto entre os dois governos desde que as tensões escalaram nas últimas semanas – isto é, após a realização do polêmico referendo venezuelano, uma ameaça de invasão territorial e a iminência de um conflito armado na fronteira com o Brasil.
A reunião foi promovida pela Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e a Comunidade do Caribe (Caricom), com o apoio do Brasil, em meio à crescente preocupação com os cada vez mais duros confrontos verbais entre os dois governantes sobre o Essequibo, uma área de 160 mil km² na fronteira entre os dois países.
Os governos da Venezuela e da Guiana concordaram, nessa quinta-feira, em não usar a força na controvérsia sobre o Essequibo, um território rico em petróleo que ambos os países disputam há mais de um século, conforme declarado em um comunicado conjunto.
Guiana e Venezuela “concordaram que direta ou indiretamente não se ameaçarão, nem usarão a força mutuamente em nenhuma circunstância, incluindo aquelas decorrentes de qualquer controvérsia existente entre ambos os Estados”, indicou parte do acordo lido por Ralph Gonsalves, primeiro-ministro de São Vicente e Granadinas, sede do encontro onde os presidentes Irfaan Ali e Nicolás Maduro se encontraram pessoalmente.
Antes mesmo de ocorrer, sabia-se que a reunião mostraria posições antagônicas de cada uma das partes envolvidas no conflito. Enquanto o líder venezuelano considerava o encontro como “uma grande conquista para abordar de maneira direta a controvérsia territorial”, Ali negou repetidamente que a disputa estaria na agenda da reunião e insistiu em sua posição de que a questão deve ser resolvida na Corte Internacional de Justiça (CIJ), cuja jurisdição sobre o assunto não é reconhecida pelo governo venezuelano.
“A fronteira terrestre não é uma questão para discussões bilaterais e a resolução da questão cabe devidamente à Corte Internacional de Justiça, onde deve permanecer até que o tribunal dê a sua decisão final sobre o mérito do caso”, escreveu Ali em uma carta endereçada ao primeiro-ministro do país caribenho, Ralph Gonsalves, que facilitou a reunião entre os dois líderes de Estado.
O Brasil, que defende uma solução pacífica, anunciou a decisão de reforçar a presença militar na fronteira e intensificou seus contatos diplomáticos para mediar a disputa pela região do Essequibo, tentando exercer um papel de liderança regional. O assessor especial Celso Amorim, ex-ministro das Relações Internacionais, foi designado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para acompanhar presencialmente a reunião dessa quinta.
De um lado, a Guiana se atém ao Laudo Arbitral de Paris, de 1899, no qual foram estabelecidas as fronteiras atuais. Do outro, a Venezuela se apoia em sua interpretação do Acordo de Genebra, firmado em 1966 com o Reino Unido, antes da independência guianesa, em que Londres e Caracas concordam em estabelecer uma comissão mista “para buscar uma solução satisfatória”, já que o governo venezuelano considerou o laudo de 1899 “nulo e vazio”.
Sem solução, a questão foi parar nas mãos da CIJ em 2017, por definição do secretário-geral da ONU, António Guterres, que se valeu da prerrogativa estabelecida pelo próprio Acordo de Genebra no caso de as partes não chegarem a um entendimento.
A briga ganhou novos capítulos após descoberta, em 2015, de grandes reservas de petróleo na região. A Guiana iniciou licitações para explorar campos petrolíferos em águas rasas e profundas em 2022, o que Caracas rejeitou, considerando-as ilegais. As informações são do jornal O Globo e da agência de notícias AFP.