Quarta-feira, 30 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 23 de julho de 2022
Aos 80 (há anos gosta de dizer que tem 80, embora os faça mês que vem), Isabel Allende, a escritora latino-americana que mais livros vendeu na História, continua sendo uma mulher de vanguarda. Depois de dois casamentos de 29 e 28 anos, separou-se do segundo marido e, um ano e meio depois, aceitou o insistente pedido de Roger, um advogado americano que todos os dias acorda ao seu lado e diz, ela conta com orgulho, sentir-se feliz “como uma criança que irá ao circo”.
O casamento está prestes a completar três anos, e hoje a única preocupação de Isabel é o que Roger fará após aposentar-se, em breve. Parar não é uma opção para ela, que acusa o feminismo de ter abandonado mulheres acima dos 50.
“Falamos sobre as mulheres até a menopausa, é como se desaparecessem”, alfineta Isabel, que depois da segunda separação começou a fazer exercício todos os dias e garante poder subir uma escada correndo e ter um preparo físico melhor do que tinha há 15 anos.
O sexo, confessa, continua sendo importante em sua vida. “O amor é o mesmo de quando era jovem, mas com sentido de urgência. Não temos tempo para briguinhas, ciúmes, temos de resolver as coisas na hora”, afirma a escritora, que mora numa pequena casa de apenas um quarto em São Francisco, nos Estados Unidos.
1) A senhora voltou a se casar depois dos 70 anos. Como foi essa experiência?
Eu me separei, pela primeira vez, aos 45 anos. Poucos meses depois, conheci Willy, meu segundo marido. Fiquei 28 anos casada com ele, e com o primeiro foram 29 anos. Aos 74, eu me separei de Willy, e as pessoas me perguntavam como podia me separar com essa idade, depois de tudo o que tinha investido na vida com ele. Diziam que era preciso ter muita coragem para se separar aos 74 anos. A decisão foi minha, e vou lhe dizer que é preciso mais coragem para ficar numa relação que não funciona do que para tomar a decisão de estar sozinha. Mas decidi estar sozinha. Comprei uma casa pequena, que tem apenas um quarto, e me mudei com minha cachorrinha. Um ano e meio mais tarde, um homem, que tinha ouvido uma entrevista minha no rádio, me escreveu. Ele continuou escrevendo nos cinco meses seguintes. Minha assistente começou a investigar quem ele era. Sabíamos até a placa de seu carro. Ela preparou uma ficha com todos os dados de Roger e disse que era um advogado com escritório na Park Avenue, em Nova York, e viúvo. Ela até achou uma foto da casa dele! (risos). Roger não está nas redes sociais, mas hoje você consegue informação sobre qualquer pessoa. Tive uma viagem a trabalho para Nova York e decidi que queria conhecê-lo. Tivemos um encontro e, três dias depois, ele me pediu em casamento. Até anel ele tinha. Pensei que estava louco ou muito necessitado. Respondi que se estivesse disposto a ir até a Califórnia um fim de semana, poderíamos ser amantes, mas casamento nem pensar.
2) A senhora se casou apaixonada?
Sim, mas não apaixonada como em outras vezes. Não foi uma paixão avassaladora, como quando fugi com um argentino e deixei meus filhos (na época, estava exilada na Venezuela, no final da década de 1970). Hoje, não faria isso nem por Antonio Banderas! O amor é o mesmo, mas as necessidades são diferentes. Com 25 ou 45 anos, você ainda está cheia de hormônios e com um futuro enorme pela frente. A maneira de viver o amor é mais impulsiva. Hoje, sinto que o amor é o mesmo de quando era jovem, mas com um sentido de urgência. Não temos tempo para briguinhas, ciúmes. Resolvemos as coisas na hora. Tudo no amor é mais imediato.
4) Como foi, na intimidade, estar com outro homem, depois dos 70? O prazer muda?
Muda tudo. Você deve conhecer a outra pessoa, e não é igual a quando você tem 45. Mas a relação sexual sempre é importante. Para alguns casais que estão há 50 anos juntos, é quase como estar com um irmão, e entendo que seja assim. Mas, quando começamos de novo, o sexo é importante.
5) Sua vigência como escritora e vida ativa ajudam no processo de envelhecimento?
Uma grande falha do movimento feminista foi esquecer das mais velhas. O feminismo focou nos jovens e nas mulheres em idade de reprodução. Depois dos 50, passamos a ser ignoradas. Falamos sobre as mulheres até a menopausa. Depois, é como se desaparecêssemos. Mas, depois dos 50, podemos viver 30 ou 40 anos mais, e também somos vítimas do machismo e do patriarcado. Podemos contribuir com o movimento feminista, não temos a mesma energia, a mesma criatividade, mas temos a experiência, e isso é muito importante. Precisamos encontrar sozinhas o que for necessário para nos manter de pé.
6) Como a senhora, que é muito vaidosa, vive o processo de envelhecimento?
Envelhecer é inevitável. Mas faço mais exercício hoje do que em qualquer outro momento de minha vida, e assim me mantenho dentro do meu peso, continuo flexível, subo correndo a escada, tenho bom equilíbrio, consigo botar uma calça sem precisar ficar me apoiando numa parede. Fisicamente, estou melhor do que estava há 15 anos.