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Mundo Príncipe saudita posa de reformista, mas, em pouco mais de um ano, apertou o cerco a jornalistas, ativistas e mídias sociais

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Além do aumento do cerco à imprensa, MBS também tomou uma série de medidas para limitar o acesso a mídias sociais. (Foto: Reprodução)

Desde que foi apontado como herdeiro do trono saudita, no ano passado, Mohamed bin Salman tem tentado se mostrar reformista, ousado e moderno. Ao mesmo tempo em que assoprava de um lado, MBS, como é conhecido, mordia de outro. Desde que se tornou líder de facto do país, ele vem apertando mais o cerco contra a imprensa, aumentando a supressão das liberdades políticas e a capacidade de adversários expressarem discordância.

O assassinato do jornalista saudita Jamal Khashoggi foi apenas a manifestação mais violenta das inúmeras medidas que MBS vem adotando há pouco mais de um ano para cercear a já rarefeita liberdade de expressão na Arábia Saudita e controlar todas as manifestações contrárias à família real saudita.

O expurgo que ele promoveu, em novembro de 2017, ao prender uma série de magnatas e dezenas de membros da família real por suposto envolvimento em corrupção, é um exemplo. “A medida garantiu a MBS o controle dos principais veículos midiáticos do país, jornais, rádios e televisão”, afirma o cientista político saudita Madawi al-Rasheed, professor da London School of Economics.

Muitos dos detidos acabaram por negociar sua libertação, renunciando a seus bens. O mais proeminente dos detidos foi Waleed al-Ibrahim, presidente da rede MBC, que continua sendo uma das redes privadas mais influentes do mundo árabe.

Agora MBS controla a emissora. O bilionário Alwaleed bin Talal também foi forçado a entregar seus ativos, incluindo a rede Rotana. Saleh Kamel, dono da Rede Árabe de Rádio e Televisão, também renunciou a suas ações na companhia. “O Ocidente viu MBS como um reformista, e a sociedade saudita, cansada de corrupção, apoiou as medidas, só que isso garantiu a Bin Salman controle quase total da imprensa”, diz Al-Rasheed.

Antes de MBS, a situação já não era boa para os jornalistas. O país ocupa o 169º lugar entre os 180 do Índice Mundial de Liberdade de Imprensa da ONG Repórteres Sem Fronteiras. “A situação piorou. Hoje são 18 jornalistas presos na Arábia Saudita e ao menos 5 sites tiveram de suspender as atividades nos últimos dois anos em razão de perseguições judiciais da família real saudita”, afirma Assad Abu Khalil, professor de ciência política na California State University. “MBS aumentou o uso indevido de tribunais especiais de terrorismo para perseguir jornalistas e dissidentes.”

Em fevereiro, esses tribunais foram usados para condenar um colunista a 5 anos de prisão por “insultar a corte real”. Um caso emblemático foi o do popular jornalista Yemini Marwan al-Mureisi, que está sob custódia desde junho.

Mureisi sempre evitou questões polêmicas ou políticas que poderiam ter entrado em conflito com as autoridades. Escrevia sobre ciência, tecnologia e inovação. Mas, ao criticar um projeto de MBS, as autoridades sauditas detiveram o jornalista e ninguém sabe seu paradeiro.

Além do aumento do cerco à imprensa, MBS também tomou uma série de medidas para limitar o acesso a mídias sociais, com controle de buscas no Google, punição judicial para “ofensas” e “sátiras” contra a família real em redes sociais. Os sauditas passam em média quatro horas por dia em mídias sociais (principalmente YouTube e Facebook), e as mulheres passaram a usar o Facebook para criar grupos e burlar os rígidos controles sociais impostos a elas.

Uma lei aprovada há dois meses permite que usuários de mídias sociais que postem ou compartilhem sátiras que “atentem contra a religião” sejam aprisionados por até 5 anos.

Aqueles considerados culpados de distribuir conteúdo on-line “perturbador da ordem pública” também estariam sujeitos a uma multa de três milhões de rials (R$ 3 milhões). “Produzir e distribuir conteúdo que ridiculariza, zomba, provoca e perturba a ordem pública, os valores religiosos e a moral pública através das mídias sociais será considerado um cibercrime”, afirmou, em nota, o Ministério Público do país depois da aprovação da lei.

A ativista política Al-Ghomgham e quatro outros dissidentes, incluindo o marido dela, Moussa al-Hashem, foram presos em 2016 por organizar protestos contra o governo após a Primavera Árabe. Eles continuam detidos. Suas acusações incluem várias ofensas “terroristas”, incluindo filmagens de protestos contra o regime e, posteriormente, publicá-las nas mídias sociais.

Em razão das perseguições, em 2017, Jamal Khashoggi deixou sua casa na Arábia Saudita para se autoexilar em Washington, temendo ser preso por suas opiniões políticas. Há menos de seis meses, ele deu uma entrevista à revista britânica The Economist.

“Eu fugi porque vi amigos jornalistas, ativistas, personalidades da mídia social, todos perseguidos e presos. O mais terrível: não havia razão. Alguns ficaram oito meses presos e não foram acusados de nada. Quando você é preso por não fazer nada, é mais doloroso. Eu não aguentaria, por isso decidi fugir”, contou. Mas, na Arábia Saudita de MBS, nem os que fogem têm direito à discordância.

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