Dada a repercussão nacional do fato, o colunista buscou novas informações sobre o polêmico caso envolvendo o processo de Recuperação Judicial da Ulbra, a Universidade Luterana do Brasil. Após a suspensão dos leilões do curso de medicina e dos imóveis, atendendo pedido da Universidade Brasil, por suspeitas de vícios nos editais, o Juízo de Canoas intimou CVM (Comissão de Valores Mobiliários), MEC (Ministério da Educação), PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional), AGU (Advocacia Geral da União), Ministério Público e credores para se manifestarem.
A AGU já se manifestou, sustentando que o leilão é nulo por falta de autorização prévia do MEC, circunstância que, por si só, já tornaria todo o certame viciado. Todavia, chama a atenção o pronunciamento contundente da PGFN. A Fazenda Nacional afirmou nos autos do processo (Recuperação Judicial n.º 5000461-37.2019.8.21.0008) que a Aelbra, Associação Educacional Luterana do Brasil, mantenedora da Ulbra, está usando a recuperação judicial “para, de uma forma sem precedentes, praticar fraudes e outros ilícitos com o intuito de buscar enriquecimento próprio e lesar credores, sobretudo o Fisco” e aponta que “estes personagens estão agindo em conluio com o fim principal de dilapidar o patrimônio da Recuperanda e lesar o interesse de seus credores.”
A PGFN menciona também que os professores da reitoria da Ulbra fizeram uma manobra “surpreendente” no final de 2018. Transformaram a Aelbra em S/A, tornando-se eles próprios acionistas.
Passados três anos, venderam as ações para a Rede Evolua Educação, empresa que pagou R$ 10 milhões para cada professor, totalizando a cifra de R$ 40 milhões, valores já documentados pela PGFN, que pediu autorização para juntar ao processo, por conta do sigilo. Não se sabe se as autoridades pretendem avançar em outros níveis de quebras de sigilo, para saber se os professores repassaram recursos a outros personagens. Agora, com a revelação dos valores, descobriu-se que a compra foi financiada pelo fundo Vanguard.
Graças a uma manobra, credor e devedor se tornaram a mesma pessoa
A administradora do Vanguard é a PLANNER TRUSTEE Distribuidora, instituição pertencente a Maurício Quadrado que, por sua vez, é sócio de Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, o banco em maior ascensão no atual cenário nacional. Em outras palavras, segundo a PGFN sustenta, a Rede Evolua adquiriu a Aelbra para o Master ingressar numa recuperação judicial e realizar operações em detrimento dos credores, o que configura manobra fraudulenta que transgride múltiplas normas jurídicas.
Rompimento de um acordo deu origem à disputa
Na sua manifestação, a Procuradoria da Fazenda Nacional descreve de forma bastante clara todos os passos que levaram à manobra. Segundo a PGFN, a venda das ações da Aelbra só aconteceu porque foi firmado um Memorando de Entendimento (MOU) entre a Rede Evolua e o Vanguard, envolvendo duas sociedades de propósito específico denominadas LMA e LMJ, onde esta última seria a responsável por adquirir a faculdade de medicina. A PGFN menciona ainda a manobra visando, “a ocultação, a todos os envolvidos, da verdadeira composição societária da Aelbra”.
O acordo estabeleceu que a PLANNER TRUSTEE, por ser a gestora do Vanguard, iria selecionar veículos de investimento para captação de recursos destinados à aquisição de créditos “em montante suficiente para assegurar a maioria dos votos em deliberação de assembleia de credores”.
O veículo indicado para comprar os créditos e aprovar o plano de recuperação foi o fundo Calêndula, que se apresentou como único interessado em adquirir o curso de medicina, “tornando-se, em suma, credora e devedora ao mesmo tempo”, informa a PGFN.
Vedação legal para o banco estar nas duas pontas
O advogado Fábio Medina Osório, ex-Ministro-Chefe da AGU, que representa a Universidade Brasil no processo, deixa claro que os pedidos de anulação dos editais dos leilões de venda de ativos da Ulbra, inclusive dos imóveis, seguem o mesmo raciocínio da PGFN. Ele explicou ao colunista esta situação:
“Caso o curso de medicina seja arrematado pelo Calêndula, livre de sucessão nas dívidas da Recuperanda, ficará configurado que, com a entrada do Banco Master no negócio, o Fundo agiu como agente da Aelbra para fraudar a sucessão. O que se discute é que a execução das obrigações previstas no MOU, o Memorando de Entendimento, foi desvirtuada”, esclarece Medina Osório.
Medina Osório também argumenta que “não havia impedimento para que o dono da Universidade Brasil participasse do negócio, pois as medidas cautelares vigentes à época se limitavam à atuação dele como administrador, não havendo que se cogitar de restrição ao direito à propriedade do capital social de outras empresas”.
Ouvido pela coluna, Medina Osório acrescentou: “o que está descrito no MOU é um negócio jurídico cujas obrigações, em determinado momento, passaram a ser descumpridas por influência do Master. Os advogados que trabalhavam para o dono da Universidade Brasil, e agiram com deslealdade, usaram esse álibi de que seria melhor o Sthefano, filho do empresário José Fernando Costa, controlador da Universidade Brasil se afastar, mas é um aconselhamento sem qualquer fundamento, pois fruto da traição profissional. Tanto a Rede Evolua, representada pelo advogado Carlos Melke, quanto a LMJ, tendo à frente o advogado Tárik Alves de Deus, permitiram a entrada do Banco na operação, o que era algo que o nosso cliente não cogitava, porque é vedado à instituição atuar nas duas pontas, pela Lei de Recuperações”, explica o advogado.
Acredite: Advogado atuou simultaneamente a favor, e contra o cliente
O colunista também ouviu o empresário José Fernando Costa, que até então não tinha se manifestado publicamente sobre o caso. Ele revelou que foi apresentado ao advogado Thomás Dulac Müller, em dezembro de 2021, pouco antes da assinatura do acordo. Thomás Müller, segundo o controlador da Universidade Brasil, participou das tratativas negociais envolvendo ele próprio, Fernando, Mauricio Quadrado e Carlos Melke, inclusive levando o filho de Fernando Costa para dentro da ULBRA, para que tomasse conhecimento da gestão. Thomás participou de reuniões dentro do próprio Banco Master com os personagens da operação e chegou a comer churrasco com o filho de Fernando, Sthefano, em sua residência, em Porto Alegre. Um detalhe importante que Fernando Costa aponta:
– O financiamento obtido foi de 60 milhões, mas apenas 40 milhões foram usados na aquisição da Aelbra. Há 20 milhões perdidos no meio do caminho”.